O panorama do pensamento religioso moderno, em particular a Igreja do século XXI, enfrenta um dilema desafiador. Que poderia ser esta aberração doutrinária e de onde ela se origina?
O Apóstolo Paulo ordena em Tito 3:10, 11: — “Ao homem herege, depois de uma e outra admoestação, evita-o, sabendo que esse tal está pervertido, e peca, estando já em si mesmo condenado”.
Como disse John Owen: — “Uma Igreja não pode envolver em sua comunhão Agostinho e Pelágio, Calvino e Armínio[2]”.
O sistema doutrinário conhecido como Arminianismo enquadra-se neste aviso paulino. Ele procede das crenças do Pelagianismo e do Semi–Pelagianismo, os quais vêm influenciando sutilmente a doutrina da Igreja há mais de um quarto de milênio (Judas 1:4[3]). Figuras bem conhecidas, como Charles Grandison Finney (1792 – 1875) e John Wesley (1703 – 1791), carismáticos como eram, difundiram essa doutrina e ressuscitaram o engano pelagiano, lançando novamente a Igreja de Cristo em turbulência. Se pudéssemos retroceder no tempo, ao período em que o discurso teológico entre o Arminianismo e as Igrejas reformadas dos Países Baixos estava em seu auge, encontraríamos indivíduos que propagavam com fervor doutrinas divergentes do Evangelho de Jesus Cristo.
O Sínodo de Dort (também conhecido como o Sínodo de Dordt ou Sínodo de Dordrecht), um sínodo internacional que teve lugar em Dordrecht, na Holanda, de 1618 a 1619 pela Igreja Reformada Holandesa, enfrentou o Arminianismo quando este se manifestou por meio dos ensinamentos diretos de Jacó Armínio (1560 – 1609) e de seus seguidores, os Remonstrantes. Dort declarou que, em reação aos Artigos e Opiniões arminianas e remonstrantes, Armínio e os Remonstrantes: — “fazem ressurgir do inferno o erro pelagiano[4]”. Afirmaram que o Arminianismo “engana os simples[5]”, “é uma invenção do cérebro humano[6]”, é um “erro pernicioso[7]”, “cheira a Pelágio[8]”, “se opõe a toda a Escritura[9]”, é “erro grosseiro[10]”, “milita contra a experiência dos santos e é contrário à Escritura[11]”, “contradiz a Escritura[12]”, “tenta dar ao povo o veneno mortal do Pelagianismo[13]”, “contradiz o Apóstolo” e “contradiz o Salvador[14]”, “é um insulto à sabedoria de Deus[15]”, “se opõe aos claros testemunhos da Escritura[16]”, “é um ensino inteiramente pelagiano e contrário a toda a Escritura[17]”. Os cristãos devem saber que “a Igreja primitiva já condenou esta doutrina há muito tempo nos pelagianos[18]”, “é evidentemente pelagiana[19]”, e “anula a própria graça da justificação e regeneração[20]”.
Os professores ortodoxos, teólogos e ministros da Holanda e da Inglaterra buscaram incessantemente suprimir o ensino dos arminianos e proibir o exercício daquela fé que firmemente condenavam como herética. Isso conseguiram fazer com notável eficácia mediante a convocação do Sínodo de Dort. Por essas razões, o Arminianismo sempre foi considerado não somente erro, mas heresia.
Os arminianos de hoje não são, necessariamente, da mesma estirpe dos antigos. O arminianismo histórico pode, de fato, ser visto como uma distorção doutrinária. Todavia, o arminianismo contemporâneo é mais intricado; mescla uma miríade de perspectivas teológicas, formando uma espécie de guisado teológico pútrido. É importante reconhecer que os arminianos modernos podem sustentar crenças drasticamente distintas de seus predecessores históricos. Ainda assim, permanecem em erro.
Hoje, impõe-se avaliar cada Igreja “arminiana” caso a caso, pois a compreensão teológica na cristandade do século XXI revela-se, em grande parte, difusa, ambígua e, por vezes, contraditória.
Deve-se agir com cautela ao se categorizar todos os que se identificam como “arminianos”, pois muitos sequer compreendem plenamente o termo, quanto menos aderem rigorosamente às suas implicações históricas. Ao se indagar uma congregação sobre a diferença entre arminianismo e calvinismo, é provável que se receba uma variedade de respostas — muitas delas afastadas da compreensão teológica acurada. Ainda assim, há aqueles que perseveram em sua lealdade ao Arminianismo histórico, sustentando e mantendo, inclusive, numerosos portais eletrônicos dedicados ao enaltecimento e à difusão de tal doutrina. Como afirmou outrora John Owen, tais indivíduos trazem à luz “as profundezas e astúcias de Satanás”.
Ao lidarmos com tais divergências teológicas, é imprescindível que abordemos cada “arminiano” individualmente, discernindo suas perspectivas particulares. Suas crenças podem inclinar-se à heresia danosa ou revelar apenas uma alma em luta por compreender a graça divina e a queda humana. Todavia, em toda interlocução, cumpre aos que se identificam como calvinistas manter-se equânimes, mansos, caridosos e firmes na proclamação da graça de Deus revelada em Jesus Cristo.
Charles Spurgeon observou acertadamente: — “Frequentemente se afirma que as doutrinas profundas que prezamos e encontramos na Escritura são imorais. Pergunto: — Quem teria a audácia de fazer tal afirmação, considerando que os indivíduos mais santos foram seus defensores? Desafio qualquer um que rotule o Calvinismo como uma religião imoral a refletir sobre o caráter de Agostinho, Calvino ou Whitefield, que em várias épocas foram os principais defensores do sistema da graça, ou mesmo os Puritanos, cujas obras estão repletas dessas doutrinas”.
Por que, então, os calvinistas continuam a ser vistos como em grave erro, enquanto os arminianos são tidos por ortodoxos? A resposta reside no declínio do pensamento crítico e no aumento da suscetibilidade à desinformação. As pessoas tendem a aceitar falsidades com facilidade, à semelhança de Eva no Jardim do Éden, permitindo que tais ideias errôneas infestem a Igreja até cumprirem seu tempo.
Ao longo dos séculos, defensores da verdade ergueram-se contra as heresias teológicas — mesmo durante a Idade das Trevas, notória pelo obscurantismo intelectual. Atualmente, a ousadia de proclamar a verdade bíblica esmaece, e muitos titubeiam em refutar tais equívocos. John Owen, em sua magna obra “The Death of Death in the Death of Christ”, exortou os fiéis a combaterem os erros difundidos por Armínio, Pelágio e seus seguidores. Todavia, tais clamores frequentemente ecoam em ouvidos surdos. É imperioso que homens resolutos se levantem em defesa da verdade, mesmo ante as mais duras adversidades.
Sistemas teológicos desviantes, como o Arminianismo e o Pelagianismo, não conduzem ao encontro do Cristo bíblico. Ao contrário, obstruem tal busca, pois aqueles que aderem a tais doutrinas arriscam tornar-se “filhos da perdição duas vezes”, como os que as propagam. A sinceridade não assegura a verdade. Arminianos sinceros, porém teologicamente equivocados, podem ser mais devastadores para a Igreja do que sinceros budistas.
O Arminianismo[21] revela-se especialmente pérfido ao revestir-se tão habilmente com a linguagem cristã que muitos são seduzidos a crer em sua veracidade. É uma obra–prima de engano, semeada por Satanás, que gera confusão generalizada e perpetua falsas doutrinas.
Palavra do Dr. C. Matthew McMahon.
Aos que ainda não se debruçaram sobre os fundamentos do Arminianismo, é compreensível que surja a indagação: — por que se considera tal sistema um desvio doutrinário?
Contudo, embora este portal — www.apuritansmind.com/arminianism — não contenha todas as respostas, busco oferecer mais artigos e reflexões que possam auxiliar o peregrino espiritual na busca pelo Cristo bíblico.
Compreendo que alguns arminianos possam sentir-se inquietos com este conteúdo. Se assim for, recorde as palavras de 2 Timóteo 2:24 – 26, que exortam à mansidão, paciência e humildade no ensino, esperando que Deus conceda arrependimento para o pleno conhecimento da verdade. Assim como Jesus fez com o jovem rico, o verdadeiro amor revela-se no compartilhar da verdade, ainda que esta provoque dor. Almejo, pois, fortalecer a fé e conduzir os errantes de volta a Cristo, na esperança de que Deus lhes conceda arrependimento. Aos que se dispõem a ouvir, o próprio Salvador promete: — “As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem” (João 10:27). Em tua jornada, jamais esqueças de considerar primeiramente a Providência divina. O ensino contido em Rute 2:2, 3[22] revela como Deus ordena todas as coisas para o cumprimento do seu eterno propósito.
Paz e graça.
Pr. Dr. Plínio Sousa[23].
[1] – “A 21st Century Doctrinal Plague — Arminianism” por Dr. C. Matthew McMahon.
[2] – Introdução à obra “Uma Exposição do Arminianismo”.
[3] – “Porque se introduziram furtivamente alguns, os quais já antes estavam escritos para este mesmo juízo, homens ímpios, que convertem em dissolução a graça de Deus, e negam a Deus, único dominador e Senhor nosso, Jesus Cristo” (ACF).
[4] – Sínodo de Dort, Cânon 2, Artigo 3, na Rejeição dos Erros.
[5] – Cânon 1, Artigo 1.
[6] – Cânon 1, Artigo 2.
[7] – Cânon 1, Artigo 3.
[8] – Cânon 1, Artigo 4.
[9] – Cânon 1, Artigo 5 e Cânon 3, Art. 4.
[10] – Cânon 1, Artigo 6.
[11] – Cânon 2, Artigo 1.
[12] – Cânon 2, Artigo 4.
[13] – Cânon 2, Artigo 6.
[14] – Cânon 2, Artigo 7.
[15] – Cânon 3, Artigo 1.
[16] – Cânon 4, Artigo 4.
[17] – Cânon 3, Artigo 7.
[18] – Cânon 3, Artigo 9.
[19] – Cânon 5, Artigo 2.
[20] – Cânon 5, Artigo 3.
[21] – Para uma análise mais profunda de suas raízes históricas e de sua disseminação insidiosa, recomendo a leitura do artigo que traduzimos deste mesmo autor: — “O Cativeiro Pelagiano da Igreja” — disponível em: https://santoevangelho.com.br/o-cativeiro-pelagiano-da-igreja-2/ Trata-se de uma exposição lúcida das continuidades entre o Arminianismo e os erros antigos de Pelágio, que ainda assombram a cristandade.
[22] – “E Rute, a moabita, disse a Noemi: — Deixa-me ir ao campo, e apanharei espigas atrás daquele em cujos olhos eu achar graça. E ela disse: — Vai, minha filha. Foi, pois, e chegou, e apanhava espigas no campo após os segadores; e caiu-lhe em sorte uma parte do campo de Boaz, que era da família de Elimeleque” (ACF).
[23] – Tradutor: — notas e significações.
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