A VOCAÇÃO INTELECTUAL CRISTÃ — UM CHAMADO À EXCELÊNCIA

 

A vocação intelectual cristã não admite o “mais ou menos”, todos nós que assumimos a posição de um intelectual temos, obrigatoriamente, de nos entregar completamente. Consagrada ao Deus da verdade em sua totalidade, a nossa vida é dEle em todas as situações que ela integra. Diante de qualquer trabalho, devemos dizer: — “É meu dever fazê–lo, logo é também meu dever fazê–lo muitíssimo bem, já que o que não se acaba não é. Na medida em que eu fizer mal, eu falharei na vida, tendo desobedecido ao Senhor e faltado a Igreja. Nessa medida eu renuncio a minha vocação. Ter uma vocação é ter a obrigação do perfeito (2 Timóteo 3:16, 17)”

Não existe tal coisa como a observância parcial da vocação intelectual cristã, porque o Fruto do Espírito Santo é impartível, não divisível. É preciso consagrar a vida inteira: — “cada pensamento e ação, cada palavra, trabalho e silêncio, a Cristo, se se deseja viver a vontade de Deus”.

A vocação intelectual cristã é essencialmente sacramental. Por “sacramento”, no sentido em que aqui é empregada a palavra, quer dizer, da maneira mais específica “mistério”, que alude a Deus manifestando sua vida, glória e poder e sua revelação à mente e ao coração humano. O mistério da bondade de Deus é o fundamento e a medida do conhecimento do homem; é de imediato o objeto (o locus) de seu estudo e devoção. No contexto de tais mistérios, o intelecto e a vontade humana são livres para prosperar e se submeter porque estão sendo cumpridos em circunspecção diante do que é incircunscritivelmente indescritível: — “A transcendência infinita de Deus, que com o tempo se Encarna” (João 1:14; Hebreus 1:1 – 4; Colossenses 2:9). Isto é, o intelecto e a vontade humana são livres para desenvolver–se e conformar–se porque estão sendo preparados em ponderações diante do que é ilimitadíssimo, inexprimível e extraordinário, a Encarnação do Verbo; em que Deus Pai fala pelo Filho por obra do Espírito Santo através das Escrituras Sagradas (Hebreus 1:1).

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E–BOOK — MORTIFICANDO O PECADO

 

A santificação é a peculiaridade e virtuosismo da santidade; é o qualitativo da santidade e o avaliatório do modo de viver santamente; quanto mais nos separarmos mais santos nos tornaremos e, mais próximos de Deus estaremos (Hebreus 12:14).

A justificação pressupõe a culpa, a santificação pressupõe a sujeira, a mortificação pressupõe a vida, precedendo esses atos.

A Lei de Deus revela a existência de sintomas graves da enfermidade mortal, mas o Evangelho garante que o fulcro da doença já foi vencido, resta apenas lutar contra e esperar o pouco que resta de pecado numa luta (e conflito) diária sob a graça e misericórdia de Deus.

 

E–BOOK — POR QUE NÃO SOMOS CATÓLICOS ROMANOS?

 

Entendemos por autoridade divina das Sagradas Escrituras a qualidade peculiar de toda a Bíblia segundo a qual, como Palavra verdadeira de Deus que é, requer, de todos os seres humanos, fé e obediência e persiste como única fonte e norma de fé e vida. O mesmo nosso Salvador reconheceu e proclamou a autoridade divina da Bíblia, citando–a como único padrão da verdade em todos os casos de controvérsia.

Uma vez que os papistas, vendo que seus dogmas não apenas carecem de fundamento nas Escrituras Sagradas, mas também são claramente comprovados como falsos por elas, trabalham acima de tudo para elevar a autoridade e a perfeição de seus dogmas a fim de confirmar suas próprias ficções, é justo que nós, que lutamos sob a bandeira de Cristo para a derrubada do reino do Anticristo e o estabelecimento do reino de Cristo, nos esforcemos para afirmar e vindicar essa palavra de Deus contra seus erros.

 

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1 – A maravilha dos Salmos.

No Prefácio do seu comentário aos Salmos, João Calvino confessa que as palavras não conseguem transmitir a maravilha deste livro inspirado: — “As variadas e resplandecentes [isto é, magníficas] riquezas que estão contidas neste precioso tesouro não são fáceis de expressar em palavras […] a grandeza (dos Salmos) não admite ser totalmente revelada[2].

Para Calvino, os Salmos são um livro único no cânone da Sagrada Escritura.

“Não há outro livro em que se encontrem elogios mais expressos e magníficos, tanto da incomparável benevolência de Deus para com a sua Igreja, como de todas as suas obras; não há outro livro em que se registem tantos livramentos, nem outro em que as evidências e experiências da paternal providência e cuidado que Deus exerce para conosco, sejam celebradas com tal esplendor de palavras, e ainda assim com a mais rigorosa união à verdade; Em suma, não há outro livro em que nos seja ensinada mais perfeitamente a maneira correta de louvar a Deus, ou em que sejamos mais poderosamente estimulados a realizar este exercício sagrado[3].

Os Salmos estão cheios de riquezas das doutrinas bíblicas, e os santos encontram neles grande bem–aventurança e paz.

“Numa palavra, não só encontraremos aqui louvores gerais da bondade de Deus, que podem ensinar aos homens a repousar somente nEle, e a buscar toda a sua felicidade somente nEle; e que se destinam a ensinar os verdadeiros crentes, com todo o seu coração, a olhar para Ele com confiança para obter ajuda em todas as suas necessidades. Mas também descobriremos que a livre remissão dos pecados, que por si só nos reconcilia com Deus, e nos proporciona uma paz estável com Ele, é tão exposta e magnificada, que aqui não falta nada que se relacione com o conhecimento da salvação eterna[4].

O reformador de Genebra vê nos Salmos um campo de treinamento essencial para a piedade cristã, especialmente “levando a cruz”. Sem dúvida, ele está a pensar nas palavras do Senhor Jesus e em “todo o itinerário da vida de Davi[5]”.

“Além disso, embora os Salmos estejam repletos de todos os preceitos que servem para enquadrar nossa vida em todas as partes da santidade, piedade e retidão, eles nos ensinarão e nos treinarão principalmente a carregar a cruz; e o carregar a cruz é uma prova genuína de nossa obediência, pois, ao fazer isso, renunciamos à orientação de nossas próprias afeições e nos submetemos inteiramente a Deus, deixando-o nos governar e organizar as nossas vidas de acordo com a sua vontade, de modo que as aflições que são as mais amargas e severas para a nossa natureza, tornam-se doces para nós, porque procedem dEle[6].

Uma característica marcante do livro dos Salmos, na avaliação de Calvino, é que eles cobrem toda a gama de emoções e enfermidades cristãs, expondo nossos corações ao olhar perscrutador de nosso Pai Celestial e chamando-nos ou atraindo-nos ao autoexame. “Tenho estado habituado”, escreve Calvino, “a chamar este livro, penso que não de forma inadequada, ‘A Anatomia de Todas as Partes da Alma’[7]. Ele explica a razão deste título perspicaz: — “[…] não há uma emoção de que alguém possa ter consciência que não esteja aqui representada como num espelho. Ou melhor, o Espírito Santo desenhou aqui […] todas as tristezas, angústias, medos, dúvidas, esperanças, preocupações, perplexidades, em suma, todas as emoções perturbadoras com que as mentes dos homens costumam ser agitadas. As outras partes da Escritura contêm os mandamentos que Deus ordenou aos seus servos que nos anunciassem. Mas aqui os próprios Profetas, visto que nos são exibidos como falando a Deus, e expondo todos os seus pensamentos e afeições mais íntimos, chamam, ou melhor, atraem cada um de nós para o exame de nós mesmos em particular, a fim de que nenhuma das muitas enfermidades a que estamos sujeitos, e dos muitos vícios com os quais abundamos, possa permanecer encobertas. É certamente uma vantagem rara e singular, quando todos os lugares ocultos são descobertos, e o coração é trazido à luz, expurgado da infecção mais nociva, a hipocrisia[8].

2 – Os Salmos e a oração.

A partir daí, Calvino elogia os Salmos por seu ensino a respeito da oração cristã. Ele fala brilhantemente do privilégio e acesso que temos às cortes do Todo–poderoso: — “[…] pareceu-me necessário mostrar […] que este livro nos dá a conhecer este privilégio, que é desejável acima de todos os outros — que não só nos é aberto o acesso familiar a Deus, mas também que temos permissão e liberdade concedida para expor diante dEle nossas enfermidades, que teríamos vergonha de confessar diante dos homens[9].

Ele prossegue falando da utilidade dos Salmos como um auxílio para a oração verdadeira e sincera, pois: — “É através da leitura destas composições inspiradas, que os homens serão mais efetivamente despertados para um senso de suas enfermidades, e, ao mesmo tempo, instruídos na busca de remédios para sua cura[10]. Isto é impressionante, uma vez que muitos vêem o canto reformado dos Salmos como um obstáculo à verdadeira súplica. “A verdadeira oração”, dizem eles, “é agitada pelo canto de hinos [de composição humana]”. O grande Reformador era de outra opinião: — “Em uma palavra, tudo o que pode servir para nos encorajar quando estamos prestes a orar a Deus nos é ensinado neste livro[11]. O crente reconhecerá a verdade destas palavras sobre a união vital entre os Salmos (lidos e cantados) e a oração fervorosa: — “A oração genuína e fervorosa procede primeiro de um senso de nossa necessidade, e depois, da fé nas promessas de Deus. É através da leitura dessas composições inspiradas, que os homens serão mais efetivamente despertados para um senso de suas doenças, e, ao mesmo tempo, instruídos na busca de remédios para sua cura. Numa palavra, tudo o que possa servir para nos encorajar quando estamos prestes a orar a Deus é–nos revelado e ensinado neste livro. E não apenas as promessas de Deus nos são apresentadas nele, mas muitas vezes nos é mostrado alguém que está, por assim dizer, entre os convites de Deus, por um lado, e os impedimentos da carne, por outro, cingindo-se e preparando-se para a oração: — ensinando-nos, assim, se em qualquer momento formos agitados por uma variedade de dúvidas, a resistir e lutar contra elas, até que a alma, liberta e desembaraçada de todos esses impedimentos, se eleve a Deus; e não só isso, mas mesmo quando estivermos no meio de dúvidas, medos e apreensões, esforcemo-nos na oração, até experimentarmos alguma consolação que possa acalmar e trazer contentamento às nossas mentes[12].

Calvino identifica os Salmos como a melhor ajuda na oração: — “uma regra melhor e mais infalível para nos guiar neste exercício (da oração) não pode ser encontrada noutro lugar senão nos Salmos[13]. Com base nisto, chega a uma conclusão importante: — “Em suma, como invocar a Deus é um dos principais meios de garantir nossa segurança, e como uma regra melhor e mais infalível para nos guiar neste exercício não pode ser encontrada em nenhum outro lugar senão nos Salmos, segue-se que, em proporção à proficiência que um homem terá alcançado em compreendê-los, será seu conhecimento da parte mais importante da doutrina celestial[14].

Se isso é verdade, devemos confessar o quanto precisamos dos Salmos!

Poderemos alguma vez ter o suficiente deles, se a oração cristã (que o Catecismo de Heidelberg, Pergunta e Resposta 116[15], chama de “a parte principal da gratidão que Deus requer de nós”) é tão forte ou tão fraca quanto nossa compreensão sincera dos Salmos?

O raciocínio de Calvino aqui deveria nos estimular a ler, cantar e meditar nos Salmos. Estará o reformador de Genebra a identificar aqui o problema da oração no nosso país? A ignorância dos Salmos e a popularidade da hinódia moderna e sem inspiração?

Calvino identificou essencialmente três elementos no culto público da Igreja de Deus: — a Palavra (lida e pregada), os sacramentos (batismo e a Ceia do Senhor) e a oração (falada e cantada – os Salmos!). Escreve Barry Gritters: — “[…] embora o canto seja uma das duas formas de oração, e seja em si mesmo adoração, Calvino afirma que as orações cantadas estimulam mais e mais profundas orações e, portanto, melhor adoração[16]. Calvino declara: — “Além disso, é uma coisa muito conveniente para a edificação da Igreja cantar alguns Salmos na forma de orações públicas pelas quais se ora a Deus ou se canta seus louvores, de modo que os corações de todos possam ser despertados e estimulados a fazer orações semelhantes e a render louvores e agradecimentos semelhantes a Deus com amor comum (Artigos para a Organização da Igreja e seu Culto em Genebra [1537])”.

Assim, cantar as orações dos Salmos estimula-nos a continuar a orar e a louvar.

3 – Os Salmos e a adoração.

É claro que Calvino elogia os Salmos não apenas no que diz respeito à doutrina cristã, piedade e oração, mas também no que diz respeito ao culto cristão. Assim como regulam a nossa adoração, os Salmos asseguram-nos que Deus se deleita com uma adoração bíblica e sincera.

Além disso, também nos é prescrita uma regra infalível para nos orientar quanto à maneira correta de oferecer a Deus o sacrifício de louvor, que ele declara ser o mais precioso aos seus olhos e de mais suave aroma[17].

Os Salmos não apenas nos ensinam a maneira aceitável de louvar a Deus, mas também nos vivificam nesse chamado pelo Espírito Santo.

“[…] em suma, não há outro livro em que nos seja ensinada mais perfeitamente a maneira correta de louvar a Deus, ou em que sejamos mais poderosamente estimulados a realizar esse exercício sagrado[18].

Ouçam Calvino exaltar o efeito revigorante para a alma que tem a convicção de cantar Salmos no idioma vernacular (língua comum): — “Os Salmos podem estimular-nos a elevar os nossos corações a Deus e despertar-nos para um fervor em invocar, bem como em exaltar com louvores a glória do seu Nome. Além disso, com isto, reconhecer-se-á de que benefício e consolação o papa e as suas cúpulas privaram a Igreja, pois distorceram os Salmos, que deveriam ser verdadeiros cânticos espirituais, num murmúrio entre si sem qualquer entendimento[19].

Nos nossos dias, não é apenas “o papa e as suas cúpulas” que privam a Igreja de cantar Salmos em congregação. Nas Igrejas Evangélicas, hinos não–inspirados são muito mais frequentemente cantados do que os 150 Salmos, e o canto dos Salmos é frequentemente ridicularizado como “morto”, como se as palavras de Cristo não fossem “espírito” e “vida” (João 6:63)!

Ler, pregar e cantar os Salmos gerou o amor de Calvino por eles. Herman J. Selderhuis afirma: — “Três fatos são apresentados por Erwin Mulhaupt (em seu trabalho em 1959) para explicar a afeição de Calvino por este livro bíblico. Em primeiro lugar, os Salmos tinham um significado especial para Calvino, em termos pessoais. Ele reconheceu muito de si mesmo em Davi e, em tempos difíceis, encontrou conforto e força neste livro da Bíblia. Em segundo lugar, os Salmos são o único livro do Antigo Testamento a partir do qual Calvino pregava aos domingos. Assim, os Salmos eram a única exceção à sua prática habitual de pregar a partir do Novo Testamento aos domingos, enquanto o Antigo Testamento era reservado para os dias de semana. Em terceiro lugar, Mülhaupt[20] mencionou que Calvino promoveu o canto dos Salmos durante o culto da Igreja como nenhum outro[21].

Numa nota de rodapé, Selderhuis observa que, num livro posterior (1981), “Mülhaupt dá as mesmas três razões, mas menciona primeiro a do canto dos Salmos[22]. Aparentemente, Mülhaupt chegou a ver que o canto dos Salmos aumentava especialmente o amor de Calvino pelo livro mais longo da Bíblia.

Calvino entendeu as implicações da excelência dos Salmos com respeito ao conteúdo do louvor cantado na Igreja. Em sua “Epístola ao Leitor”, prefixada ao Saltério de Genebra (1542), ele argumenta: — “Ora, o que Santo Agostinho diz é verdade, que ninguém é capaz de cantar coisas dignas a Deus a não ser que as tenha recebido dEle. Por isso, depois de termos procurado bem por todos os lados e de termos pesquisado por alto e por baixo, não encontraremos melhores cânticos nem mais apropriados para o assunto do que os Salmos de Davi, que o Espírito Santo produziu e proferiu através dele. E, além disso, quando os cantamos, temos a certeza de que Deus põe as palavras na nossa boca, como se Ele próprio cantasse em nós para exaltar a sua glória”.

Nos termos dessa declaração, os hinos modernos certamente não são “dignos para Deus”, pois não foram “recebidos […] dEle”. “Procurando por todos os lados”, inclusive através das miríades de hinários não–inspirados, “não encontraremos melhores cânticos nem mais apropriados para o propósito [de adoração] do que os Salmos de Davi, que o Espírito Santo criou e revelou através dele”. Cantando os Salmos, ao contrário dos hinos modernos, temos a certeza de que o conteúdo do nosso louvor o agrada e o engrandece: — “temos a certeza de que Deus põe as palavras na nossa boca, como se Ele próprio cantasse em nós para exaltar a sua glória”.

Não é de se admirar que Calvino tenha trabalhado tão arduamente, diante de muita oposição, para estabelecer o canto congregacional em Genebra! Este foi mesmo um dos pontos essenciais em que Calvino e Farel insistiram nos “Artigos para a Organização da Igreja e seu Culto em Genebra”, que eles apresentaram ao conselho da cidade (16 de Janeiro de 1537). Ao instituir a ordem da Igreja para que o povo “vivesse de acordo com o Evangelho e a palavra de Deus”, os Artigos de Calvino exigiam (entre outros elementos essenciais): — [1] – que os cidadãos subscrevessem a confissão de fé, [2] – que a excomunhão fosse usada como um instrumento eficaz de disciplina da Igreja, [3] – que se cantassem Salmos no culto público, [4] – que se catequizassem as crianças na doutrina bíblica para manter a aliança, e [5] – que se redigissem ordenanças para o casamento.

A declaração de Calvino (“é uma coisa muito conveniente para a edificação da Igreja cantar alguns Salmos na forma de orações públicas pelas quais se ora a Deus ou se canta seus louvores, de modo que os corações de todos possam ser despertados e estimulados a fazer orações semelhantes e a render louvores e agradecimentos semelhantes a Deus com um amor comum”) que vem nesses Artigos deixa claro que, para o Reformador de Genebra, o canto congregacional de Salmos é vital na reforma da Igreja.

Calvino também queria melodias de qualidade — “pomposas e majestosas” — para cantar os Salmos. Assim, ele declara em seu Prefácio ao Saltério de Genebra: — “Deve haver sempre a preocupação de que o cântico não seja ligeiro nem frívolo, mas tenha grandeza e majestade, como diz Santo Agostinho. E assim há uma grande diferença entre a música que se faz para entreter os homens […] e os Salmos que se cantam na Igreja na presença de Deus e dos seus anjos”.

Nos seus primeiros anos em Genebra, Calvino não ficou impressionado com a qualidade do canto em Genebra, pelo que tomou a medida prática de exigir que as aulas de catecismo para as crianças incluíssem a memorização e o canto de Salmos. Os responsáveis pela Igreja e os professores das escolas cristãs tinham um papel importante neste domínio. Calvino afirma: — “Escreve uma carta aos conselheiros para os informar de que o Senhor deseja que os jovens aprendam a cantar os Salmos, e que o reitor da escola e o seu diretor ensinem a música dos ditos Salmos[23].

O amor de Calvino pelos Salmos levou-o a trabalhar durante muitos anos na produção, ampliação e melhoramento de Saltérios franceses. Em Estrasburgo, em 1539, quando Calvino tinha cerca de trinta anos, ele publicou seu primeiro Saltério, consistindo de 19 Salmos em tradução francesa — 6 dele mesmo e 13 de Clemente Marot[24]. O primeiro Saltério de Genebra de Calvino (1542) incluía mais 17 Salmos métricos de Marot e revisões de versões anteriores. A edição de 1543 continha 50 Salmos. Em 1551, este número tinha aumentado para 83. Marot morreu em 1544; a sua obra foi continuada por Teodoro de Beza (1519 – 1605). Louis Bourgeois foi o principal editor musical, mas as melodias dos Saltérios de Genebra foram também fornecidas por Guillaume Franc (1505 – 1571) — cantor e professor de música em Genebra —, Pierre Certon (1510 – 1572) e Pierre Davantès, o Velho, conhecido como Antesignanus (1525 – 1561) — Maistre Pierre, provavelmente Pierre Davantes.

Saltérios em constante expansão continuaram a ser produzidos em Genebra: — “em 1562 (dois anos antes da morte de Calvino e para seu grande prazer) apareceu um Saltério métrico com todos os 150 Salmos. Esse Saltério foi reimpresso (surpreendentemente) 62 vezes em seus primeiros dois anos e foi traduzido para (ainda mais surpreendentemente) vinte e quatro idiomas[25].

Seguindo o Reformador de Genebra, Holliday afirma que: — “foi o movimento calvinista que foi a fonte primária para a adaptação dos Salmos para o canto congregacional”, antes de citar dois estudiosos para o mesmo efeito: — “O canto dos Salmos foi uma das marcas incontestavelmente distintivas da cultura calvinista na Europa e na América nos séculos XVI e XVII (embora não o seja, infelizmente, hoje — para grande perda de muitos calvinistas professos)”.

“Os calvinistas estavam convencidos de que podiam legitimamente apropriar-se dos Salmos para si mesmos […]. Os Salmos eram as suas canções que eles cantavam como o povo eleito de Deus numa relação de aliança com Ele[26].

Infelizmente, poucos hoje em dia experimentam esta relação viva com os Salmos como “os seus cânticos”. Hinos não–inspirados são cantados quase, se não na totalidade, exclusivamente, e os Salmos inspirados por Deus são vistos como enfadonhos e (em grande parte) irrelevantes. Os nossos antepassados calvinistas ter-se-iam perguntado se o conhecimento dos cristãos modernos sobre a Predestinação e a Aliança da Graça de Deus é deficiente. No entanto, com a recuperação das verdades da Eleição e da Aliança de Graça de Deus, vem a recuperação do canto dos Salmos de Deus, não apenas como “seus cânticos” (os cânticos da Igreja do Antigo Testamento e do Novo Testamento, especialmente das Igrejas Reformadas), mas como “nossos cânticos”. Ficamos maravilhados e admirados com o rico tesouro do Saltério e, como Calvino diz: — “[…] temos a certeza de que Deus coloca as suas palavras nas nossas bocas, como se Ele próprio estivesse a cantar em nós para exaltar a sua glória[27].

Paz e graça.
Pr. Dr. Plínio Sousa[28].

[1] – Rev. Angus Stewart. John Calvin on the Wonder of the Psalms — https://cprc.co.uk/articles/johncalvinpsalms/ Acessado em 2023.

[2] – Baker ed., p. xxxvi; as páginas indicadas em algarismos romanos referem-se a este livro.

[3] – Baker ed., p. xxxviii – xxxix.

[4] – Baker ed., p. xxxix.

[5] – Baker ed., p. xliv.

[6] – Baker ed., p. xxxix.

[7] – Baker ed., p. xxxvi – xxxvii.

[8] – Baker ed., p. xxxvii.

[9] – Baker ed., p. xxxviii.

[10] – Baker ed., p. xxxvii.

[11] – Baker ed., p. xxxvii.

[12] – Baker ed., p. xxxvii – xxxviii.

[13] – Baker ed., p. xxxvii.

[14] – Baker ed., p. xxxvii.

[15] – Pergunta 116 do Catecismo de Heidelberg — “Por que a oração e necessária aos cristãos?”. Resposta — “Porque a oração é a parte principal da gratidão, que Deus requer de nós. Além disto, Deus quer conceder sua graça e seu Espírito Santo somente aos que continuamente lhe pedem e agradecem, de todo o coração” (Salmos 50:14, 15; Mateus 7:7, 8; Lucas 11:9, 10; 1 Tessalonicenses 5:17, 18) — nota do tradutor.

[16] – “Music in Worship: — The Reformation’s Neglected Legacy”, Protestant Reformed Theological Journal, vol. 42, no. 1, Novembro, 2008, p. 86.

[17] – Baker ed., p. xxxviii.

[18] – Baker ed., p. xxxviii – xxxix.

[19] – Citado em Charles Garside, Jr., The Origins of Calvin’s Theology of Music: 1536 – 1543, Transactions of the American Philosophical Society, vol. 69, parte 4, Philadelphia: The American Philosophical Society, 1979, p. 10.

[20] – O Pastor Erwin Friedrich Mülhaupt (1905 – 1996) foi um historiador da Igreja protestante alemã e da Reforma. O seu Doutorado com Emanuel Hirsch em Göttingen foi sobre os sermões de João Calvino. O nome de Mülhaupt está associado sobretudo a três grandes edições sobre a história da Reforma: — [1] – a edição em cinco volumes da Interpretação de Lutero dos Evangelhos (1938 – 1954), [2] – a edição em três volumes da Interpretação de Lutero dos Salmos (1959 – 1965) e [3] – a sua participação numa edição internacional dos sermões de Calvino, que não tinham sido editados anteriormente, em sete volumes (1961 – 1981). Mülhaupt é caracterizado como autoconfiante e original, espirituoso e pessoalmente sociável, com uma extraordinária produção de trabalho — nota do tradutor.

[21] – Calvin’s Theology of the Psalms, Grand Rapids: Baker, 2007, p. 14.

[22] – Ibid., p. 14, n. 4.

[23] – Citado em Ford Lewis Battles, The Piety of John Calvin, Grand Rapids: Baker, 1978, p. 142.

[24] – Clemente Marot (1496 – 1544) foi valete de Francisco I (rei, 1515 – 1547), que promoveu o Renascimento na França. Preso em 1526, suspeito de ser luterano. Por volta de 1530 era poeta bem conhecido. Em 1533 começou a versificar Salmos. Esteve exilado por questões políticas e religiosas, entre 1534 e 1536, por ter participado da questão das cartazes contra a missa católica. Em 1535 escreveu a famosa “Épistre au Roy, du temps de son exil à Ferrare”. Em 1536 abjurou essa heresia. Entre 1541 e 1543 traduziu Salmos de Davi (“Trente Psaumes”, 1541, “Cinquantes Psaumes”, 1543) que foram o fundamento do Saltério Huguenote, impresso por Denis Janot, que eram cantados na corte e na cidade. Seu primeiro salmo traduzido foi o de número 6 (“Éternel! Neme permis pas dans Ta colère, et ne me châtie pas dans Ta fureur”). As traduções de Marot continuaram, durante os quatro séculos seguintes, a ser cantados pelas congregações protestantes. Marot liderou muitos versejadores.  A “Sorbonne” foi contrária às traduções da Bíblia em francês. Em 1542, Marot foi para Suíça (Genebra) a fim de juntar-se a Calvino, que tinha aproveitado 13 Salmos dele em seu primeiro livro (“Aulcuns Psalmes”, Strasbourg, 1539), dando início ao hábito do canto congregacional na Liturgia Reformada. Calvino encorajou o canto de canções piedosas nos lares dos crentes e de harmonizações de Salmos metrificados de Marot, das quais as melhores eram de Goudimel e de Bourgeois. Em 1551 Claude Goudimel (1505 – 1572) tinha harmonizado, a quatro vozes, oito Salmos. Embora tenha composto missas, motetos e Magnificats, talvez a salmodia de Goudimel tenha começado na época da Reforma. O coral protestante surgiu de uma forma extra–litúrgica e, pouco a pouco, ocupou lugar na música religiosa reformada. Entre 1558 e 1561 Goudimel passou para o protestantismo. Foi assassinado na Noite de São Bartolomeu (24 de agosto de 1572), em Lyon (França). Em 1543 Marot foi para a Itália onde morreu, e foi sepultado na catedral de Turim. Em 1574 seu corpo foi retirado por ordem expressa do bispo de Turim — nota do tradutor.

[25] – William L. Holladay, The Psalms through Three Thousand Years, Minneapolis: Fortress Press, 1993, p. 199.

[26] – William L. Holladay, The Psalms through Three Thousand Years, Minneapolis: Fortress Press, 1993, p. 198.

[27] – Este artigo está inacabado e será desenvolvido no futuro — nota do autor.

[28] – Tradutor: — notas e significações.

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