“‘Vi emergir do mar uma besta que tinha dez chifres e sete cabeças e, sobre os chifres, dez diademas e, sobre as cabeças, nomes de blasfêmia’ (v. 1). ‘Vi ainda outra besta emergir da terra; possuía dois chifres, parecendo cordeiro, mas falava como dragão’ (v. 11). ‘Aqui está a sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem. Ora, esse número é seiscentos e sessenta e seis’ (v. 18)” (Apocalipse 13:1, 11, 18).
O capítulo 12 revela que o próprio diabo é a origem mais profunda do mal. Breves referências a ele já apareceram nos capítulos 2:13, 6:8 e 9:11. O diabo é o grande iniciador dos sofrimentos dos santos e das perseguições que eles sofrem; ele libera o Anticristo e o Falso Profeta[1].
Já no capítulo 13, dois terríveis aliados do dragão (Satanás) entram em cena, uma besta a emergir do mar (Anticristo), e a outra besta a emergir da terra (Falso Profeta). Segundo escreveu o estudioso do Novo Testamento e escritor de comentários bíblicos, William Hendriksen (1900 – 1982): — “A primeira é um monstro de indizível horror, a segunda tem uma aparência inofensiva e, por isso, é vista como menos perigosa do que a primeira; a primeira besta sobe do mar, a segunda, da terra; a primeira é a mão de Satanás, a segunda é a mente do diabo[2]”.
Duas bestas grotescas surgem para formar uma trindade profana com o dragão[3]. A primeira besta, que sobe do mar, serve ao dragão e exerce o seu poder; a segunda besta, que sobe da terra, é subordinada tendo como missão promover adoração à primeira besta.
No capítulo 11:7[4], a besta “sobe do abismo”, mas no capítulo 13:1[5], “sobe do mar”. O professor de Novo Testamento na “Trinity Evangelical Divinity School”, Grant R. Osborne (1942 – 2018), especialista em Hermenêutica Bíblica[6], nos Evangelhos e no Livro do Apocalipse, expõe exegeticamente que “o abismo se refere às profundezas insondáveis do mar e, assim, essas duas imagens são sinônimas[7]”.
No seu “Comentário Exegético sobre o Livro de Apocalipse”, comentando sobre o capítulo 9:1, Osborne explica que abismo “se origina da imagem inicialmente associada às profundezas impenetráveis do oceano, como se vê na expressão ‘superfície do abismo’, de Gênesis 1:2 — LXX (cf. também Gênesis 7:11; 8:2)”. Em várias passagens, o termo indica as “águas do grande abismo” (Salmos 42:7; Isaías 51:10). O abismo tornou–se uma expressão idiomática para o lugar dos mortos — “as profundezas da terra” (Salmos 63:9; 71:20). Possivelmente pelo fato de os mortos serem impuros, a palavra grega passou a ser usada para “poço” ou “prisão domiciliar” (1 Enoque 18:20), na qual anjos caídos eram aprisionados (1 Enoque 10:4 – 6; 18:9 – 16; Evangelho Apócrifo de João 5:3 – 11). No Novo Testamento, ela ocorre duas vezes fora de Apocalipse: — “para descrever o lugar dos mortos, em Romanos 10:7, e para indicar a prisão dos espíritos maus, em Lucas 8:31”. A imagem também é encontrada em 2 Pedro 2:4 e Judas 6, em que anjos são “confinado[s] nas trevas em algemas eternas, para o juízo do grande dia”. Em Apocalipse, o abismo é uma prisão fechada e, quando ela é aberta, a fumaça de seu fogo sobe (9:2) e a “besta emergirá dali no momento determinado por Deus (11:7; 17:8)”. No abismo, “Satanás será aprisionado por mil anos, e o local ficará novamente trancado durante esse tempo (20:1 – 3)”. O “poço” do abismo faz referência ao “buraco (o termo também pode indicar ‘cisterna’) que desce até a prisão propriamente[8]” — “[…] lançou–o no abismo [ἄαβισσο[9]], fechou–o e pôs selo sobre ele [Satanás]” (Apocalipse 20:3).
O versículo 1, do capítulo 13, alude a Daniel 7:3 (LXX), em que as quatro bestas do sonho de Daniel também (“ἀνέβαινον ἐκ τῆς θαλάσσης” [anebainon ek tēs thalassēs]) “subiram do mar”. Portanto, com o dragão do capítulo 12, a (“θηρίον” [thērion]) “besta[10]”, da mesma forma, está relacionada ao Leviatã, ou monstro do “mar” [θαλάσσης], do Antigo Testamento.
Grant R. Osborne, significando os termos “ὄφις” (serpente) e “δράκων” (dragão), ambos referentes à Satanás, explica a luz do capítulo 12 de Apocalipse, versículo 3, que: — “Na LXX, o dragão é, com frequência, sinônimo de ‘ὄφις’ (ophis, ‘serpente’). No Antigo Testamento, há a serpente, Leviatã, Beemote, Tanin e Raabe. Por exemplo, embora em Gênesis 3:1 – 24 a ‘serpente’ que enganou Eva seja ‘ὄφις’, em Êxodo 7:9 – 12, a ‘serpente’ [ou a ‘cobra’ na qual a vara de Arão se tornou] é chamada de ‘δράκων’, assim como no caso de ‘veneno de serpentes’ em Deuteronômio 32:33; Jó 20:16 (cf. Jó 26:13). O Leviatã é associado a Raabe em Jó 9:13; 26:12; Isaías 51:9; Salmos 89:10; e aos ‘monstros marinhos’ [Tannin] em Salmos 74:13[11]. Finalmente, ‘δράκων’ é usado para se referir ao ‘Leviatã’ que emerge das profundezas do mar em Jó 3:8; 41:1; Salmos 104:26; Isaías 27:1[12]”.
Como definiu Gregory Kimball Beale (1949), professor de Novo Testamento e de Teologia Bíblica no “Reformed Theological Seminary”, em Dallas, “a imagem do monstro marinho é usada por todo o Antigo Testamento para representar reinos ímpios que perseguem o povo de Deus[13]”.
De modo semelhante ao sentido de “abismo[14]”, definimos conceitualmente o mar como sendo “profundezas imperscrutáveis e o caos da morte”, pelo fato de que para as nações em volta da Bacia do Mediterrâneo essa era a significação. Portanto, interpretamos a figura como se segue, que o mar representa as nações e seus governantes, em que “o rumor dos povos é comparado ao rumor do mar; e o movimento das nações como o movimento de muitas águas[15]”. É expressamente o que diz o Profeta Isaías: — “Ai do bramido dos grandes povos que bramam como bramam os mares, e do rugido das nações que rugem como rugem as impetuosas águas” (17:12; cf. Isaías 57:20). Apocalipse 17:15[16] prova esse ponto. A besta que “sobe do mar” está bem associada à besta que “sobe do abismo” (11:7). “Essa última, a que ‘sobe do abismo’, é a forma final que a anterior, que ‘sobe o mar’, assume”. A besta nascida do mar simboliza o poder perseguidor de Satanás incorporado em todas as nações ao longo da História. O mar aqui, indubitavelmente, é “um símbolo da superfície agitada da humanidade não regenerada, e especialmente da caldeira fervente da vida nacional e social da qual os grandes movimentos históricos do mundo se levantam”.
Por esse motivo, Edwards utilizou–se da imagem do “mar agitado” para referir–se à condição de homens ímpios (não–regenerados): — “As almas dos ímpios são comparadas nas Escrituras com o mar agitado. Por enquanto Deus controla as iniquidades deles pelo seu imenso poder, como faz com as ondas enfurecidas do mar, dizendo: — ‘Virão até aqui, mas não prosseguirão’. Mas se Deus retirasse deles seu poder refreador, seriam todos tragados por elas[17]”.
Portanto, o “‘Leviatã’ ou o ‘dragão’ passou a representar todos os terrores do mar e, assim, a presença do mal e da morte”. Assim como o dragão que convoca essa criatura das profundezas, a primeira besta é inimiga de Deus e de seu povo. E da mesma forma que ele, a primeira besta tem (“κέρατα δέκα καὶ κεφαλὰς ἑπτά” [kerata deka kai kephalas hepta]) “dez chifres e sete cabeças”, ainda que a ordem seja inversa às “sete cabeças e dez chifres” do dragão.
Isso se dá porque as cabeças são a característica fundamental do dragão, ao passo que os chifres são a característica fundamental da besta. As coroas estão sobre as cabeças do dragão, mas aqui há (“δέκα διαδήματα” [deka diadēmata]) dez coroas “sobre os chifres” da besta. Fundamentalmente, a imagem das sete cabeças e dos dez chifres faz paralelo com a descrição do dragão, mostrando que a besta está unida a ele, ainda que tenha um papel distinto. Essa descrição inicia a outra paródia [ou grande imitação]: — “Enquanto o dragão usurpa o papel de Deus, a besta, que ‘emerge do mar’, usurpa o papel de Cristo (com a segunda besta ou o ‘Falso Profeta’, os três personagens malignos formam a falsa trindade [ou trindade satânica] em 16:13)”.
Mapa cristológico e parodial:
1 – Deus a cabeça do Filho [Cristo/Palavra] (1 Coríntios 11:3).
2 – Satanás a cabeça das bestas que “emerge do mar” (Anticristo) e da terra (Falso Profeta).
3 – Deus deu autoridade a Cristo (Mateus 11:27; Mateus 28:18; João 17:2; 1 Coríntios 15:24; Efésios 1:20; Filipenses 2:9, 10; Colossenses 2:10; 1 Pedro 3:22).
4 – O dragão “deu” autoridade para as bestas (Apocalipse 13:2, 4, 5, 7, 12).
5 – Cristo usa a Escritura exercendo o Ofício de Profeta através do Espírito Santo.
6 – O Anticristo deturpa/nega a Escritura através do “Falso Profeta[18]” [“a besta que emerge da terra”] que atua espiritualmente [através do “espírito do anticristo”][19].
7 – Cristo é morto e ressuscita para uma nova vida (Apocalipse 5:6).
8 – O Anticristo é morto e ressuscita para uma “nova vida” (Apocalipse 13:3).
9 – Cristo tem seguidores com seu Nome escrito na testa (Apocalipse 14:1).
10 – O Anticristo tem seguidores com seu nome escrito na testa (Apocalipse 13:16).
11 – Cristo possui chifres (Apocalipse 5:6).
12 – O Anticristo possui chifres (Apocalipse 13:1).
13 – Cristo tem autoridade sobre todas as “tribos, línguas, povos e nações” (Apocalipse 5:9; 7:9).
14 – O Anticristo tem autoridade sobre as “tribos, línguas, povos e nações” (Apocalipse 13:7; 17:12, 15).
15 – Cristo recebe adoração mundial (Apocalipse 5:8 – 14).
16 – O Anticristo recebe adoração mundial (Apocalipse 13:4, 8).
17 – Os crentes são marcados com o “selo” (sinal) de Cristo (Apocalipse 7:3, 4; 22:4).
18 – Os descrentes têm o “selo” (sinal) de Satanás (Apocalipse 13:16, 17).
19 – Cristo tem uma vinda ou manifestação final, embora Cristo caminhe para a vitória eterna e o Anticristo para a destruição eterna.
20 – O Anticristo tem uma vinda ou manifestação final (Apocalipse 17:7 – 18).
Segundo escreveu João o mapa proposto aqui está certo, que o engano, desde a época de João, é promovido por “muitos falsos profetas [que] se têm levantado no mundo” (1 João 4:1) atuantes pelo “espírito do anticristo que não confessa que Jesus Cristo veio em carne” (1 João 4:3). A grande problemática colocada pelo Apóstolo ocorre quando a Pessoa de Cristo é frontalmente atacada na sua humanidade (Encarnação), “todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio ‘em carne’ [Encarnação/Humanidade] não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e eis que já agora está no mundo” (1 João 4:3). Aqui, temos um Norte!
Vale ressaltar que o termo “ἀντίχριστος” (antichristos) só é empregado no Novo Testamento, nas epístolas joaninas (1 João 2:18, 22; 4:3). João foi o Apóstolo quem mais escreveu sobre a Cristologia, a Doutrina de Cristo, em termos de se revelar a união das naturezas[20], divina e humana, na Pessoa do Redentor (João 1:1, 14).
João Calvino comentando acerca de 1 João 4:3, afirma que: — “[‘E esse é o espírito do Anticristo’] que o Apóstolo acrescentou, para tornar mais detestável os impostores que nos afastam de Cristo. Já dissemos que a doutrina a respeito do reino do Anticristo era bem conhecida; para que os fiéis tivessem sido avisados sobre a futura dispersão da Igreja, para que pudessem exercer vigilância. Justamente, então, eles temeram o nome como algo básico e ameaçador. O Apóstolo diz agora que todos aqueles que depreciaram a Cristo eram membros desse reino. E ele diz que o ‘espírito do anticristo’ viria e que ele já estava no mundo, mas em um sentido diferente. Ele quer dizer que ele já estava no mundo, porque continuava em segredo sua iniquidade. Como, no entanto, a verdade de Deus ainda não havia sido subvertida por dogmas falsos e espúrios, como a superstição ainda não havia prevalecido em corromper a adoração a Deus, pois o mundo ainda não havia se afastado perfidamente de Cristo, como a tirania, oposta, para o reino de Cristo, ainda não havia se exaltado abertamente, ele diz, que viria”.
Mas antes de comentar sobre o versículo 3, João Calvino assevera um ponto importante no versículo 2[21], que “para muitos (como é habitual em coisas novas) abusaram do Nome de Cristo com o propósito de servir seus próprios erros. Alguns fizeram meia profissão de Cristo; e quando conseguiram um lugar entre seus amigos, tiveram mais oportunidade de ferir sua causa. Satanás aproveitou a ocasião para perturbar a Igreja, especialmente através do próprio Cristo; pois Ele é a pedra da ofensa, contra quem todos necessariamente tropeçam e não seguem o caminho certo, como nos é mostrado por Deus”.
Temos, portanto, neste capítulo 13, uma nova descoberta e descrição dos inimigos da Igreja, não outros inimigos além dos mencionados antes, mas descritos de outra maneira, para que os métodos de sua inimizade possam aparecer mais plenamente. Eles são representados como essas duas bestas; da primeira temos um relato (v. 1 – 10) e da segunda também (v. 11 – 18).
Pelo primeiro [relato] alguns entendem “Roma pagã”, e pelo segundo “Roma papal”; mas outros entendem que “Roma papal é representada por ambos os animais [bestas], pelo primeiro relato [referente ao Anticristo] em seu poder secular, pelo segundo relato [referente ao Falso Profeta] em seu poder eclesiástico; por esses poderes depreciam a Cristo, não mais em segredo de iniquidade, mas subvertida a religião por dogmas falsos e espúrios, com superstição, corrompem a adoração a Deus com o propósito de servir seus próprios erros — o clericalismo, o sacramentalismo, o eclesiocentrismo, a santolatria e, especialmente, a mariolatria etc. —, fazendo assim meia profissão de Cristo e ferindo deliberadamente e obstinadamente sua causa”.
O poder secular da besta que “sobe do mar”.
A primeira besta, cujos chifres representam poder, recebe sua energia de Satanás: — “O dragão deu à besta o seu poder, o seu trono e grande autoridade” (v. 1, 2).
Os diademas (v. 1) simbolizam as falsas reivindicações da besta por autoridade soberana e universal, reivindicações que se opõem ao verdadeiro “Reis dos reis e Senhor dos senhores”, que também usa “muitos diademas” (19:12, 16)[22].
É quase inacreditável que toda a terra venha a adorar o dragão e a besta: — “[…] e toda a terra se maravilhou, seguindo a besta; e adoraram o dragão porque deu a sua autoridade à besta; também adoraram a besta, dizendo: — Quem é semelhante à besta? Quem pode pelejar contra ela?” (v. 3, 4).
O versículo 4 termina com um breve hino de louvor, que consiste em duas perguntas retóricas. A primeira pergunta “Quem é semelhante à besta?” é uma paródia irônica de hinos de louvor a Deus no Antigo Testamento (Êxodo 15:11; Salmos 18:31; 89:8; Miquéias 7:18). A segunda pergunta retórica está intimamente relacionada à primeira, principalmente porque quem lutou contra Satanás no céu foi Miguel (Apocalipse 12:7), cujo nome significa “Quem é semelhante a Deus?”. A ironia é agravada com a pergunta: — “Quem pode pelejar [guerrear] contra ela?”. O poder derivado da besta procede do “dragão”, que foi derrotado e expulso do céu (12:9, 10, 12, 13) e cujo tempo é curto (12:12)[23].
Beale comenta algo parecido quanto ao uso de paródia irônica de hinos de louvor a Deus no Antigo Testamento: — “A lealdade das multidões ímpias, mencionada no versículo 3, agora se expressa em adoração ao dragão: — ‘e adoraram o dragão porque deu a sua autoridade à besta’. A frase que indica essa transferência de autoridade está baseada em Daniel 7:6, em que autoridade é dada ao terceiro animal para governar a terra e perseguir. As multidões igualmente adoram a besta por causa da sua alegada incomparabilidade. Elas proclamam em sua adoração: — ‘Quem é semelhante à besta? Quem pode pelejar contra ela?’. Suas palavras constituem uma zombaria e um uso irônico de palavras semelhantes usadas corretamente para Deus no Antigo Testamento (Êxodo 8:10; 15:11; Salmos 35:10; 71:19; 86:8; 89:8; 113:5; Isaías 40:18; Miquéias 7:18). Em todas essas passagens do Antigo Testamento, a incomparabilidade de Yahweh é contrastada polemicamente com falsos deuses e ídolos[24]”.
A “besta” se assemelha ao “dragão”, entretanto, “imita burlescamente o Cordeiro tanto na descrição física como na perversão de seu poder, incluindo a recuperação de um ferimento fatal” (v. 3). O versículo 3 aponta para um detalhe da descrição da besta. Uma de suas cabeças tem um ferimento — causado por uma espada de acordo com o versículo 14 [“àquela que, ferida à espada, sobreviveu”] —, que parecia ser mortal (“ὡς ἐσφαγμένην εἰς θάνατον” [hōs esphagmenēn eis thanaton]), literalmente, “como tendo sido abatido para morte” —, “mas […] foi curado”.
Essa ferida na cabeça da besta não é outra coisa senão aquela que Cristo infligiu na sua ressurreição e é o cumprimento de Gênesis 3:15: — “Este te ferirá a cabeça”. A menção da espada que feriu a cabeça da besta em Apocalipse 13:14 faz lembrar a profecia escatológica de Isaías 27:1: — “Naquele dia, o Senhor castigará com a sua dura espada, grande e forte, o dragão [leviatã], a serpente sinuosa, e matará o monstro que está no mar”.
O fato de Isaías 27:1 também repercutir em Apocalipse 12:3, 9 aponta para conclusão de que o golpe mortal administrado à besta veio por meio da morte e ressurreição de Cristo num cumprimento inicial das palavras do Profeta. “Que uma das cabeças da besta é descrita como golpeada de morte por causa da morte e ressurreição de Cristo é confirmado por Apocalipse 12:5, 10 – 12, juntamente com Apocalipse 1:5 e 5:9” (veja sobre 12:10 – 12, em que também outros paralelos do Novo Testamento são citados afirmando que a morte e ressurreição de Cristo derrotaram o diabo[25]). “Os efeitos dessa derrota são exercidos pela fidelidade dos seguidores de Cristo” (assim 12:11, 17; Romanos 16:17 – 20)[26].
Uma das cabeças da besta parece como golpeada de morte (não “como se ela tivesse sido morta” [“as if it had been slain”] como na NASB), mas essa ferida mortal foi curada. O uso de “como” (grego, “hōs”), como em outras partes ao longo do livro, faz parte do estilo visionário de João ao apresentar algo que ele viu (cf. 4:6; 8:8; 9:7; 15:2; 19:6). E a sua tentativa de fazer uma descrição aproximada em termos humanos do que ele contemplou na visão celestial. “A ferida era real e fatal, no entanto ela parece ter sido curada porque o inimigo é capaz de prosseguir com a sua atividade. Ela é fatal porque, a partir da ressurreição, o poder de Satanás foi fatalmente restrito e seus dias estão contados”. A cura temporária representa o fato de Deus permitir que o inimigo continue a usar seus agentes no período de três anos e meio (período milenial) até a volta de Cristo (Parusia), salvaguardando ao mesmo tempo a segurança espiritual do seu povo. A expressão como golpeada de morte é quase idêntica àquela que se refere ao Cordeiro no capítulo 5:6 (cf. 5:9, 12; 13:8), em que Cristo é descrito “como tendo sido morto” (não “de pé […] como se tivesse sido morto”, como na NASB); a descrição parodia a morte sacrificial de Cristo[27]. Isso nos alerta para o fato de que “a besta está sendo estabelecida como uma imitação satânica de Cristo[28]”.
O resultado é que a “besta” ironicamente recebe a adoração mal orientada de quem (ímpios) não conhece o verdadeiro Cordeiro. Porém, a sua blasfêmia é limitada a “42 meses” (Apocalipse 11:1, 2)[29] — “toda a História da Igreja, que mede o tempo entre a Encarnação e a Parusia[30]”. Haverá muita religião na terra, mas será sem Deus e blasfema. A primeira besta se opõe a Deus: — “‘Ela abriu a boca para blasfemar contra Deus […]’ (v. 5, 6); recebe sua energia de Satanás (v. 2); é militarmente suprema: — ‘Quem pode guerrear contra ela?’ (v. 4); possui poder de extensão mundial: — ‘Foi–lhe dada autoridade sobre toda tribo, povo, língua e nação’ (v. 7); e persegue os santos de Deus: — ‘Foi–lhe dado poder para guerrear contra os santos e vencê–los’ (v. 7)”.
Os “nomes de blasfêmia” escritos sobre as cabeças da besta representam reivindicações blasfemas de realeza terrena e divina por parte da besta numa fraca imitação da verdadeira realeza de Cristo (contraste 13:1 com 17:3 e 13:7 – 13 com 1:5; 17:14; 19:12 – 16)[31].
Em Apocalipse 13:2, o dragão que dominou o capítulo 12 transfere o seu poder, o seu trono e grande [μεγάλην – megalēn] autoridade à besta. O trono de Satanás, foi dito anteriormente, estava simbolicamente localizado em Pérgamo (2:13) e é mencionado mais tarde quando um anjo derrama a sua taça sobre o trono da besta (16:10). Essas três imagens da supremacia representam a falsa alegação do dragão quanto ao domínio real, que ele compartilha com a besta, a qual age como seu plenipotenciário[32]. Alguns relacionam esta força e influência aos hereges[33].
Quem se atreveria a negar que o cenário da História Universal está sendo rapidamente preparado por tendências que conduzirão finalmente ao governo e adoração de um tal monstro? Todos aqueles que não pertencem ao Cordeiro de Deus adorarão a besta; aqui se diz o que é a marca da besta, a falsa adoração.
Certamente, o mal é unificado contra tudo que carrega o Nome de Deus. Podemos concluir que algum tipo de sistema unificado será inaugurado pelo Anticristo que entrará em guerra contra os cristãos. A conexão muito próxima entre o dragão e a besta do mar é óbvia, no sentido de que o dragão “ἔδωκεν” (Edōken) “deu” a ela suas três posses e atributos mais essenciais. Outra imitação de Deus é vista no fato de que o dragão “deu” autoridade para a besta, já que, em outras partes do livro, é Deus quem dá autoridade para a realização de obras (ver “ἐδόθη” [edothē, o passivo divino “foi dado”] em 6:2, 4, 8, 11; 7:2; 8:2, 3; 9:1, 3, 5; 11:1, 2; 12:14; 13:5, 7, 14, 15; 16:8; 19:8; 20:4). Essa usurpação da autoridade divina é uma característica básica do dragão e da besta nesses capítulos.
O poder eclesiástico da besta que “sobe da terra”.
Enquanto a primeira besta é sem dúvida um poder secular, a segunda (v. 11), como disse Lee, “é um poder mundial espiritual, o poder da ciência e do conhecimento, das idéias, do cultivo intelectual. Ambas são inferiores, ambas são bestas, e, portanto, estão em íntima afiança. A sabedoria anticristã secular está a serviço do poder anticristão mundano” (p. 671).
Esta “outra” besta imita a descrição de Cristo como o Cordeiro com sete chifres em 5:6[34]. Ela tem[35] (“κέρατα δύο ὅμοια ἀρνίῳ” [kerata dyo homoía arniō]) “dois chifres semelhantes ao de um cordeiro” e, portanto, também corresponde à advertência de Cristo acerca dos falsos profetas em Mateus 7:15: — “os falsos profetas […] vêm a vós disfarçados em pele de ovelha, mas interiormente são lobos devoradores”. O fato de que há dois chifres na segunda besta em vez de dez, como na primeira (13:1), demonstra seu papel subordinado, mas também faz alusão a Daniel 8:3, em que o “carneiro com dois chifres” representa o império medo–persa em sua oposição a Deus. Os chifres do dragão, da besta e do falso profeta retratam o poder das forças malignas no controle deste mundo, que se opõe a Deus e à sua vontade. Portanto, essa segunda besta também (“ἐλάλει ὡς δράκων” [elalei hōs drakōn]) falava como um dragão.
A segunda besta (Falso Profeta) reforça as ordens da primeira (Anticristo), e acompanha sua obra perversa com várias formas de manifestações milagrosas (v. 12, 13). O período do “tempo dos gentios” começou com a adoração imposta de uma imagem por um poderoso governante (por Nabucodonosor em Daniel 3), e este período terminará com uma semelhante adoração imposta, desta vez em escala universal.
A imagem de idolatria do Anticristo será diferente de qualquer outro ídolo da História Humana. A Escritura com desdém denuncia ídolos como “tendo olhos, mas não vendo. Tendo ouvidos, mas não ouvindo; tendo narizes, mas não cheirando. Tendo mãos, mas não apalpando; tendo pés, mas não andando; nem som algum saindo da sua garganta” (Salmos 115:5 – 7; cf. 135:15 – 17; Isaías 46:7; Jeremias 10:05; Hebreus 2:18, 19). Contudo, em outra demonstração do seu poder para enganar, a besta que sobe da terra dará “fôlego à imagem da primeira besta” (Apocalipse 13:15), para que a imagem da besta engane de forma tal, que acontecerá através de “falsos cristos e falsos profetas [que surgirão], e farão tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora, enganariam até os escolhidos” (Mateus 24:24).
Beale comenta o seguinte acerca do versículo 15 (“e lhe foi dado comunicar fôlego à imagem da besta, para que não só a imagem falasse”): — “Isso pode incluir referência a truques de mágica e fenômenos semelhantes atestados entre os supersticiosos, e até mesmo nas cortes dos imperadores romanos, mas os ‘sinais’ podem incluir real atividade demoníaca, já que demônios estavam por trás dos ídolos[36]”.
A expressão é uma maneira metafórica de afirmar que a segunda besta — “que tem aparência de cordeiro, mas que fala como dragão” (Apocalipse 13:11) —, era persuasiva em demonstrar que a imagem da primeira besta representava a “verdadeira divindade” (Anticristo), que está realmente por trás da imagem e faz decretos.
Como comentou Wesley em suas notas sobre o Livro do Apocalipse (capítulo 13): — “Toda a sucessão de Papas a partir de Gregório VII são, sem dúvida, anticristos, acrescentando aos seus predecessores um grau peculiar de maldade do abismo[37]”. Martinho Lutero citando a advertência de Cristo em Mateus 24 sobre os falsos profetas que realizam “sinais e prodígios, para enganar, se fosse possível, os escolhidos”, disse que os milagres não eram prova da autoridade papal. Ele disse que 2 Tessalonicenses 2:9 havia predito “que o Anticristo, pelo poder de Satanás, será poderoso em prodígios mentirosos”.
Grant R. Osborne assevera algo de suma importância para a compreensão dos sinais demoníacos que são realizados: — “Esses sinais miraculosos enganadores em Apocalipse 13:14 estão, antes de tudo, debaixo do controle divino (a repetição do passivo divino [“ἐδόθη” – edothē – “foi dado”] de 13:5 – 8 coloca a ação debaixo do controle de Deus) e, em segundo lugar, tem como seu propósito pleno ‘enganar’ os habitantes da terra. Satanás é o grande ‘enganador’ cósmico, a ‘antiga serpente’ (12:9) e o ‘que engana as nações’ (20:3, 8, 10). Deus ‘dá’ ao Falso Profeta poder para ‘iludir’ as nações com os milagres enganadores (13:14; 19:20). Em Romanos 1:24, 26, somos informados de que, por causa de sua absoluta depravação, ‘Deus os entregou [os gentios] a paixões desonrosas’. Aqui opera o mesmo princípio. Tudo o que o Anticristo e o Falso Profeta fazem está sob o controle de Deus e só ocorre com a permissão dEle. Visto que os habitantes da terra rejeitaram a oferta de salvação de Deus e recusaram-se a se arrepender (9:20, 21), ‘Deus os entregou’ ao ‘engano’ que eles mesmos já haviam escolhido. Eles preferiram adorar os mesmos poderes demoníacos que os torturaram e os mataram (9:1 – 19). Portanto, o Senhor está agora permitindo que eles experimentem a ilusão com toda a sua terrível força. Em certo sentido, Deus está ‘entregando-os a Satanás’ (cf. 1 Coríntios 5:5; 1 Timóteo 1:20). Entretanto, com base na ‘grande apostasia’ de Mateus e de 2 Tessalonicenses, comentada antes, esse engano provavelmente também inclui muitos da própria Igreja, que se unirão aos habitantes da terra[38]”.
Isso aponta novamente para a identidade da segunda besta como uma contraparte da Igreja e especialmente do Espírito que a capacita (sendo “fôlego” uma metáfora bíblica para o Espírito Santo (cf. Ezequiel 37:9 – 14). Em razão da natureza transtemporal do capítulo 13 observada até esse ponto, a imagem transcende uma referência restrita apenas a um ídolo qualquer da História e inclui qualquer substituto para a verdade de Deus em qualquer era. A descrição da besta, que faz morrer “quantos não adorem a imagem da besta”, tem por inspiração a ordem de Nabucodonosor em Daniel 3 no sentido de que todos adorem sua imagem ou serão mortos. A referência às classes de pessoas sob o controle da besta no versículo 16 é também um eco dos diversos grupos dos quais é exigido que adorem a imagem de Nabucodonosor em Daniel 3:2 – 7. À luz da exortação em 13:9, 10, a implicação é que os cristãos devem perseverar como os amigos de Daniel em meio ao fogo; e, como em Daniel 3, mas em escala aumentada, a recompensa pela persistência será a libertação do tormento eterno do fogo e a exaltação com Cristo[39].
Há uma progressão da autoridade, ao ser passada do dragão para a primeira besta (13:2, 4), depois, para a segunda besta (13:12) e, por fim, para os dez reis que servem a besta (17:12, 13). Apesar disso, Deus ainda é o verdadeiro soberano, pois o poder para conceder autoridade é, em última análise, dEle; e a autoridade do dragão é tanto temporária (13:5) quanto superada pela autoridade que Deus concede a seus anjos vingadores (14:18; 16:18), especialmente ao anjo com “grande autoridade” que destrói a grande Babilônia no capítulo 18:1[40].
O capítulo 13 conclui com uma profecia do que poderia ser chamado de ditadura econômica. O texto não diz que os homens não poderão comer se não tiverem a marca […] da besta, mas não poderão negociar sem esse sinal. Adicione a essa necessidade desesperada do mundo, em meio à carnificina da Grande Tribulação[41]. Após seu imenso sucesso em todo o mundo e depois de deixar sua fachada de bondade, o falso profeta vai causar a morte em tantos quantos não adorarem a imagem da besta. Tal como no caso à imagem de Nabucodonosor (cf. Daniel 3:6), a morte sentença será decretada para aqueles que se recusarem a adorar a imagem do Anticristo. Quem não se prostrar em terra e não adorá–la será imediatamente atirado numa fornalha em chamas.
O versículo que conclui este capítulo, no qual o número da besta é revelado como “666”, tem dado lugar a uma multidão de interpretações, e a vasta literatura. Livros inteiros têm sido escritos sobre este único texto. Lutero errou em pensar que fosse uma declaração cronológica. Acrescentando 666 ao ano 1000 ele obteve naturalmente, como resultado 1666 d.C., ano em que nada de significância profética aconteceu. Muitos têm tentado identificar esta pessoa descobrindo nomes cuja soma numérica das letras perfaz 666. Em nossa língua, por exemplo, X é igual a 10, L igual a 50 e C igual a 100. Há equivalentes semelhantes para as letras no hebraico, grego e latim (Gematria[42]). Alguns têm crido, então, que este número assim traduzido refere–se a Nero, o César do primeiro século, outros como Lateinos, significando, “o Latino” – atribuiu ao vocábulo Lateinos (latino) partindo de que: — Lambida = 30, Alfa = 1, Tau = 300, Épsilon = 5, Iota = 10, Nu = 50, Ómicron = 70, Sigma = 200, cuja soma confere a “666[43]”.
A partir daí, querem, os estudiosos anticlericais deduzir infantilmente que se tratando um homem latino, seria o Papa, sob a errada alegação e fraquíssimo argumento de que seria o “Vicarius Filii Deis” (atribuem em algarismo romano da seguinte forma): — V = 5; I = 1; C = 50; A = 0; R = 0; I = 1; U = 5; S = 0 — Vicarius; F = 0; I = 1; L = 100; I = 1; I = 1 — Filii; D = 500; E = 0; I = 1; S = 0 — Deis, (Vigário do Filho de Deus ou “Dux Cleri” [Chefe do Clero]) que em numeração latina dar–se–ia em uma soma igual ou correspondente a “666”.
Afirmamos que o Papa é o Anticristo, mas não em termos infantis, temos construído Teologia ao longo da História para este objetivo e ataque à Roma Papal[44]. Como escreveu Thomas Cranmer (1489 – 1556) sobre o Anticristo: — “Do que se segue que Roma é a sede do Anticristo, e o Papa é o próprio Anticristo. Eu poderia provar o mesmo por muitas outras escrituras, escritores antigos e fortes razões[45]”. E, mais, quando trazido em procissão à Igreja de Santa Maria, em Oxford, onde ele foi forçado a fazer uma declaração pública afirmando seu arrependimento por ter atacado a Igreja de Roma, Cranmer retirou sua declaração anterior de “arrependimento[46]” denunciou a doutrina da Igreja Católica e o Papa, dizendo: — “E sobre o Papa, eu o recuso, como inimigo de Cristo e Anticristo, com toda sua falsa doutrina”. Após isso, Cranmer foi executado na fogueira. Acredito que não há necessidade de ir mais adiante do que reconhecer que seis é o número do homem decaído e, portanto, o número da imperfeição, e que “666” é a “Trindade do Seis”. Até mesmo nesta passagem há uma trindade demoníaca — “Satanás, a besta que ‘sobe do mar’ (Anticristo[47]) e a besta que ‘sobe da terra’ (Falso Profeta)”.
A marca da besta.
O oitavo e último “ποιεῖ” (“eu faço”) no capítulo 13:12 – 16 aparece aqui, quando a segunda besta “faz” todos receberem o (“χάραγμα” [charagma]) “sinal” para identificar sua fidelidade para com o Anticristo. A ênfase está em (“πάντας” [pantas]) “todos”, significando todo ser humano, crente e descrente. As categorias sociais são detalhadas para especificar cada subgrupo da humanidade e a repetição do artigo antes de cada uma ressalta os grupos individualmente. Há três pares: — “pequenos e grandes, ricos e pobres, livres e escravos”. O primeiro par faz referência aos socialmente insignificantes e aos socialmente importantes. O segundo par é quase idêntico ao primeiro, exceto pelo fato de que muitas famílias entre a nobreza romana tinham perdido suas riquezas, mas ainda eram importantes. Esse tipo de lista de estratificação social aparece três vezes no livro (6:15; 13:16; 19:18, em todas elas há um contexto negativo, focalizando os descrentes), com “pequenos e grandes” ocorrendo em outras três passagens (11:18; 19:5; 20:12, sempre tendo um aspecto positivo, focalizando os crentes). O propósito em cada ocorrência é destacar toda a humanidade e mostrar que Deus não tem favoritos. Não há distinção entre os que têm posses e os que não as têm diante de Deus e de Satanás[48].
Duas regras derivam das exigências (ποιεῖ […] ἵνα em 13:16, 17) impostas pelas bestas: — a primeira é “dar” a cada um a marca ou o selo que indica propriedade. Alguns estudiosos[49] acreditam que essa é uma paródia do batismo como um selo dos cristãos. Mas isso depende da identificação do “selo”, em 7:1 – 8, com o batismo, o que é questionável. Certamente, isso é o equivalente satânico do “selamento” dos santos por Deus em 7:2 – 4, mais uma das “grandes imitações” que caracterizam o capítulo 13. Dois textos do Antigo Testamento estabelecem o contexto para a presente passagem. Em Deuteronômio 6:8[50], Deus disse aos israelitas para colocarem o Shemá (v. 4) em suas mãos e testas, texto–base dos “filactérios[51]”, carregados pelos judeus ortodoxos da época de Jesus e também dos dias de hoje (ainda que eles colocassem os filactérios em sua mão esquerda, não na direita, como aqui). É provável que João e seus leitores também vissem a marca da besta como uma paródia disso. Além disso, em Ezequiel 9:4[52], Javé exigiu que a letra hebraica “tau” fosse posta na testa de todos aqueles que haviam se arrependido da idolatria nacional, indicando que pertenciam ao Senhor. Em Salmos de Salomão 15:6 – 9[53], a marca do crente (sinalizando salvação) é contrastada com a marca do descrente (sinalizando destruição). Observe-se a polaridade resultante: — “crentes são marcados com o ‘selo’ de Cristo (Apocalipse 7:3, 4; 22:4), enquanto os descrentes têm o ‘sinal’ da besta (13:16, 17)”. Não há neutralidade nessa guerra: — não pertencer a Cristo equivale a pertencer à besta[54].
A segunda regra (ἵνα) é que “ninguém pode comprar ou vender” sem possuir o sinal. A pressão econômica para se conformar à vontade da besta tem precedente em outras partes de Apocalipse, por causa tanto da perseguição judaica quanto da gentílica. Como vários exegetas[55] ressaltam, o governo romano perseguiu, mas não usou sanções econômicas contra os cristãos; portanto, essa imagem de Apocalipse 13:17 é elaborada com base em perseguições locais. Nas cartas a Esmirna e Filadélfia, os cristãos haviam sido afetados pela pobreza (2:9) e tinham “pouca força” (3:8), por causa da oposição dos judeus. Em Pérgamo e Tiatira, a estrutura de guildas comerciais[56], que controlava a vida da cidade, impunha uma enorme pressão econômica sobre os cristãos para se conformarem às tradições pagãs. Em 7:16, os crentes no céu “nunca mais terão fome, nem sede” novamente e, em 21:4, Deus enxugará toda “lágrima de sofrimento”. Portanto, crentes perderão seus empregos e posses, mas Deus os recompensará por toda a perda que tiveram (Marcos 10:29 – 31). Isso era verdade no primeiro século, é verdade hoje e será verdade sob a perseguição econômica universal do Anticristo[57].
Por fim, nesse sentido, o uso de “666” como uma contraparte tríplice (666 sendo usado de forma semelhante a “santo, santo, santo”, em Apocalipse 4:8) da completude do número sete e da perfeição absoluta de “Jesus” como 888 poderia também ser intencional[58]. O Anticristo é “incompleto, incompleto, incompleto” comparado ao completamente perfeito “Jesus” (888). No final das contas, devemos continuar na incerteza quanto ao sentido real de “666”. A discussão acima é o limite ao qual podemos chegar; somente os leitores do primeiro século sabiam, ainda que seja difícil afirmar quanto disso eles sabiam.
O versículo 18 começa com uma exortação aos cristãos para que não se deixem iludir pela falsidade, porque Jesus Cristo lhes deu a capacidade de resistir a ela. Essa resposta é o ponto principal dos versículos 11 a 18: — “os santos são exortados a ter sabedoria espiritual e entendimento para perceber a natureza enganadora e imperfeita da besta como relatada nos versículos 11 a 17”. A exortação conclusiva é paralela à exortação conclusiva dos versículos 1 a 9. A exortação do versículo 18 tem sentido idêntico, com a exceção de que “a metáfora de um intelecto capaz de calcular é usada em lugar da metáfora do ouvido”. Se a exortação para exercitar o intelecto mediante o cálculo for tomada literalmente, então a exortação para “ter ouvidos para ouvir” deve, de modo absurdo, ser tomada de maneira literal como referindo-se a ouvir com ouvidos físicos[59].
O Anticristo é o supremo representante da humanidade não regenerada, caída e separada de Deus, ela é incapaz de alcançar semelhança divina, contudo, sempre parodia tentando. Os seres humanos foram criados no sexto dia, mas sem o sétimo dia do próprio descanso de Deus, que Adão e Eva foram designados a cumprir, eles seriam imperfeitos e incompletos. O 666 enfatiza que o Anticristo e seus seguidores estão aquém dos propósitos criativos de Deus para a humanidade, eles são imperfeitos e incompletos; é exatamente o que representa este número “666” — “rebelião e antipatia a tudo que provém de Deus, perfeição e completude”.
A exortação que traz a sentença “aqui está a sabedoria” deve ensinar a Igreja a se guardar de se embaraçar; certamente, não só com uma determinada pessoa da histórica da humanidade, se utilizando de fútil curiosidade e trivial especulação, mas com todos os tipos de particularidades, quando se notar hostilidade à palavra de Deus[60] ao longo do curso da História, sempre que houver conivência com aspectos do poder secular e eclesiástico, da cultura idólatra, todos eles sintetizando a humanidade caída, aqui deve se perceber que esses corações humanos pertencem à besta. A sabedoria é mais bem considerada à luz das palavras “compreensão dos sábios” e “entendimento” usadas em Daniel 11:33 e 12:10. Aqui, como lá, a Igreja deve ter uma percepção espiritual para compreender a tribulação escatológica realizada por uma figura real maligna que seduz outros para que reconheçam a sua “soberania”. A exortação semelhante no capítulo 17:9 (“Aqui o sentido, que tem sabedoria. As sete cabeças são sete montes, sobre os quais a mulher está assentada”) também envolve uma interpretação simbólica de um número.
Beale comentou que: — “João está exortando a Igreja a um discernimento espiritual e moral, e não a uma capacidade intelectual para resolver um problema matemático complexo, que tanto incrédulos quanto cristãos espirituais são mentalmente capazes de resolver[61]”.
A Igreja deve estar vigilante, porque o “espírito do anticristo” pode se manifestar nos lugares mais inesperados, como no âmbito familiar (2 Timóteo 3:1 – 5[62]) ou no seio da própria Igreja (1 João 2:18, 22; 4:1 – 3; 2 João 7). O Apóstolo João escreveu: — “Saíram dentre nós, mas não eram dos nossos; porque, se fossem dos nossos, teriam permanecido conosco; mas todos eles saíram para que se manifestasse que não são dos nossos” (1 João 2:19). Essa é a realidade da própria Igreja de Roma. A profecia de Daniel 11:30 – 39 já advertiu que apóstatas da comunidade da aliança seriam aliados da impiedade e se infiltrariam nas comunidades cristãs, seja em famílias ou em Igrejas. Se lermos o que o Apóstolo João escreveu, teremos uma percepção espiritual verdadeira e clara, permaneceremos fiéis e seremos os vencedores da besta, da sua imagem e do número do seu nome — “Vi como que um mar de vidro, mesclado de fogo, e os vencedores da besta, da sua imagem e do número do seu nome, que se achavam em pé no mar de vidro, tendo harpas de Deus” (Apocalipse 15:2).
Os Reformadores buscaram a marca fundamental da Igreja na palavra de Deus, nós também devemos buscar. Isto é, sem a palavra de Deus, afinal, não haveria a Igreja santa (Provérbios 29:18; Isaías 8:20; Jeremias 8:9; Oséias 4:6). Jesus Cristo reúne sua Igreja (Mateus 28:19), que é edificada sobre o ensino dos Apóstolos e Profetas, por meio da Palavra e dos dois únicos sacramentos [Batismo e Ceia] (Mateus 16:18; Efésios 2:20). Por meio da Palavra, Ele a regenera (Tiago 1:18; 1 Pedro 1:23), gera a fé (Romanos 10:14; 1 Coríntios 4:15), purifica-a e santifica-a (João 15:3; Efésios 5:26). E aqueles que assim foram regenerados e renovados pela palavra de Deus, são chamados a confessar a Cristo pela Palavra (Mateus 10:32; Romanos 10:9), ouvir sua voz pela Palavra (João 10:27) e cumpri-la (João 8:31, 32; 14:23), provar os espíritos pela Palavra (1 João 4:1) e se afastar daqueles que não seguem essa doutrina (Gálatas 1:8; Tito 3:10; 2 João 9). “A Palavra é, verdadeiramente, a alma da Igreja”, como escreveu João Calvino. Todo ministério na Igreja é um ministério da Palavra. Deus dá sua Palavra à Igreja e a Igreja a aceita, preserva, ministra e ensina, reconhecendo tão–somente a sua autoridade absolutíssima, devido sua origem ser espiritual — “Porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (2 Pedro 1:21); a Igreja a confessa diante de Deus, diante uns dos outros e diante do mundo em palavras e boas obras. Em uma marca da Igreja as outras estão incluídas como aplicações específicas. Onde a palavra de Deus é corretamente pregada, ali também o sacramento é ministrado de modo puro, a verdade de Deus é confessada em harmonia com o intento do Espírito Santo e a conduta dos cristãos é moldada de forma harmoniosa com a vontade de Deus revelada somente na Escritura.
Todos aqueles que depreciam a Jesus Cristo e sua Palavra são membros do reino da trindade satânica, já foram “selados”, portanto, pertencem ao dragão, a besta e ao falso profeta, logo ao Lago de Fogo e Enxofre, não fazem e não podem fazer parte do reino de eleitos da Trindade Santa, não pertencem ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo.
Paz e graça.
Pr. Dr. Plínio Sousa.
[1] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 228.
[2] – “Mais Que Vencedores”, p. 54. William Hendriksen escreve que, Apocalipse 13, pode ser entendido como sendo: — “[…] os agentes, instrumentos ou armas que o dragão usa em seus ataques contra a Igreja”.
[3] – ROTZ, Carol. Novo Comentário Bíblico Beacon – Apocalipse, Rio de Janeiro, Editora Central Gospel, 2015, p. 238.
[4] – “a besta que sobe do abismo lhes fará guerra, e os vencerá, e os matará” (ACF).
[5] – “e vi subir do mar uma besta” (ACF).
[6] – Mais conhecido por seu conceito de “espiral hermenêutica”, denotando um “processo ascendente e construtivo de passar de uma pré–compreensão anterior para uma compreensão mais completa, e o retorno para verificar e revisar a necessidade para correção ou mudança neste entendimento preliminar” (THISELTON, Anthony C. “Hermenêutica — Uma Introdução”, 2009, p. 14). Obra notável “A Espiral Hermenêutica”.
[7] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 550.
[8] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 407.
[9] – Abismo, “ἄαβισσος” (abussos), profundidade insondável, uma concepção especialmente judaica, o lar dos mortos e dos espíritos malignos.
[10] – Aune (1998a: 732) defende que a forma anartra de “θηρίον” aqui significa, principalmente, que a forma articular em 11:7 é uma interpolação posterior. Essa suposição é desnecessária, pois a forma articular em 11:7 deveria ser anafórica, indicando a quarta besta de Daniel 7, ao passo que a forma anartra nesse caso tem um aspecto qualitativo, enfatizando as características da “besta” conforme enumeradas neste capítulo.
[11] – Yarbro Collins, 1976:76.
[12] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 516. Por todo o Oriente Médio antigo, o monstro do mar simbolizava a guerra entre o bem e o mal, entre os deuses e o caos (para informação sobre paralelos ugaríticos, acádios, gregos e egípcios, ver Yarbro Collins 1976:77 – 79).
[13] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 251.
[14] – Veja o comentário de Apocalipse 9:1 por Grant R. Osborne.
[15] – Ver também Klaas Schilder, op. cit., p. 141.
[16] – “As águas que viste, onde se assenta a prostituta, são povos, e multidões, e nações, e línguas” (ACF).
[17] – Jonathan Edwards. Sermão intitulado: — “Pecadores nas Mãos de um Deus Irado”. “Pecadores nas Mãos de um Deus Irado” foi um sermão pregado por Jonathan Edwards em 8 de julho de 1741, em Enfield, Connecticut. O sermão foi baseado em Deuteronômio 32:35, “[…] a seu tempo quando resvalar o seu pé” e proclamava a ira de Deus contra o pecado e uma petição aos ouvintes para viver uma vida santa.
[18] – O “Falso Profeta” é = agente + falsa profecia.
[19] – Podendo ser “agentes, instrumentos ou armas que o dragão usa em seus ataques contra a Igreja”, segundo Osborne.
[20] – “Unio Personalis” ou “União Hipostática”.
[21] – Três partes devem ser consideradas a partir do versículo 1: — “Primeiro, o Apóstolo João mostra um mal perigoso para os fiéis; e, portanto, ele os exorta a tomar cuidado. Segundo, o Apóstolo prescreve como eles devem tomar cuidado, isto é, fazendo uma distinção entre os espíritos. Terceiro, João aponta um erro específico, o mais perigoso para eles; portanto, os proíbe de ouvir aqueles que negaram que o Filho de Deus apareceu em carne” (João Calvino).
[22] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 252.
[23] – ROTZ, Carol. Novo Comentário Bíblico Beacon – Apocalipse, Rio de Janeiro, Editora Central Gospel, 2015, p. 241.
[24] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 255.
[25] – A morte e a ressurreição de Cristo resultaram na excomunhão de Satanás do céu. Assim como Satanás e suas hostes caíram no início da primeira criação (Isaías 14:11 – 16; Ezequiel 28:12 – 19 [possivelmente]; 2 Pedro 2:4; Judas 6), do mesmo modo ele tinha de cair no início do que a Escritura nos diz ser a segunda e nova criação (veja 1:5 e 3:14; cf. 2 Coríntios 5:14 – 17; Gálatas 6:15). A obra de Satanás sempre foi acusar os santos (Jó 1:6 – 11; 2:1 – 6; Zacarias 3:1, 2), e por essas passagens pode-se concluir que o diabo teve a permissão de Deus para acusar o seu povo de pecado. Implícita também nas acusações estava a acusação de que o próprio caráter de Deus era corrupto. Por exemplo, em Jó 1 Satanás diz a Deus que Jó não teria sido tão fiel se Deus não o tivesse subornado com tanta prosperidade. A acusação do diabo baseia-se na pressuposição correta de que a penalidade do pecado requer um juízo de morte espiritual. Até a morte de Cristo, podia parecer que o diabo tinha boas razões, uma vez que Deus introduziu todos os santos do Antigo Testamento na sua presença salvadora sem cobrar a penalidade do pecado deles, tendo Deus adiado a execução da justa punição pelo nosso pecado (Romanos 3:25). Contudo, mesmo assim a acusação feita pelo diabo era injusta, visto que os pecados a respeito dos quais ele estava acusando as pessoas e pelos quais ele queria puni-las foram instigados pelas suas enganações. E por isso que ele é chamado de sedutor e acusador nos versículos 9 e 10. Por conseguinte, em razão das injustas acusações de Satanás e da esperada morte redentora do Messias em favor do seu povo (cf. Isaías 53), os santos do Antigo Testamento foram protegidos por Deus do perigo condenatório dessas acusações.
[26] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 253.
[27] – Fiorenza, 1991, p. 55.
[28] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 253.
[29] – ROTZ, Carol. Novo Comentário Bíblico Beacon – Apocalipse, Rio de Janeiro, Editora Central Gospel, 2015, p. 239.
[30] – A designação temporal de “42 meses”, o que equivale a “três anos e meio” ou “1260 dias” (quarenta e duas vezes 30 dias/mês) (11:3; 12:6), também é referida no Apocalipse como “um tempo, tempos e metade de um tempo” (12:14). A maioria concorda que não é literal (em oposição Walvoord, 1966, p. 178). No Antigo Testamento, 42 meses está sempre associado à “morte violenta” (2 Reis 2:23, 24; 10:14), de modo que pode significar “morte violenta inútil” (Ford, 1995b, p. 192). O termo lembra a estrutura de tempo da profecia de Daniel acerca da tribulação, que é diversas vezes rotulada como “um tempo, tempos e metade de um tempo” (Daniel 7:25; 12:7); uma semana (Daniel 9:27); 1.290 dias (Daniel 12:11); e 1.335 dias (Daniel 12:12). O cumprimento inicial ocorreu durante o reinado de Antíoco Epifânio 175 – 164 a.C. (como registrado em 1 Macabeus 1 — 3; 2 Macabeus 5). Em Mateus 24:15 e Marcos 13:14, o cumprimento de Daniel 9:27 (a divisão da septuagésima “sete”) está relacionado ao cerco de Jerusalém pelos romanos, que durou cerca de três anos e meio (veja Court, 1979, p. 87). Com base na semana de anos de Daniel (Daniel 9:27), alguns (Johnson, 1981, p. 503) acreditam que existam duas séries distintas de períodos de “quarenta e dois meses” no Apocalipse. A primeira (11:2; 12:6, 14) ocorre quando as duas testemunhas pregam, e a segunda (13:5 – 13) quando a perseguição é severa e o Anticristo governa (Beale, 1999, p. 566 – 567). A maioria concorda que a designação do tempo figurativo se refere a todas as passagens de Daniel, embora alguns (Beale, 1999, p. 567) admitam um aumento na intensidade da perseguição no final. Outros (Bratcher e Hatton, 1993, p .166; Mounce, 1998, p. 215) limitam a um curto período de tempo no final da História, quando o mal recebesse permissão para governar livremente. Aune (1998, p. 609) aponta que o “tempo, tempos e metade de um tempo” é propositadamente vago e que “três anos e meio” pode ser um número “redondo” por um período prolongado de tempo. Nesse caso, a designação de tempo refere-se a toda a História da Igreja, que mede o tempo entre a Encarnação e a Parusia (Beale, 1999, p. 565 – 568; Hughes, 1973, p. 123). O evento de Cristo inaugurou as hostilidades (veja 12:5, 6), e nunca houve um momento em que a Igreja tivesse uma relação pacífica com os que se opõem a esta (Sweet, 1979, p. 183). As possíveis razões para o uso de “três anos e meio” representar o tempo do mal incluem a extensão da seca nos dias de Elias (cf. Lucas 4:25; Tiago 5:17); o tempo entre a primeira revolta judaica de 66 d.C. e a queda de Jerusalém em 70 d.C. (Smalley, 2005, p. 274); o período aproximado do ministério de Jesus (Beale, 1999, p. 567); e o inverno babilônico medido em meses (Moffatt, 1908, p. 416). Todas essas associações são possíveis, mas nenhuma é convincente.
[31] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 252.
[32] – Quem tem plenos poderes.
[33] – Cesário de Aries e Ecumenius em Weinrich, 2005, p. 198 – 200.
[34] – Contra Mounce (1998: 255), que diz que a primeira besta imita Cristo, não a segunda. Mas não há nenhum motivo para que a segunda besta não possa também imitar Cristo, e a combinação do “cordeiro” com o “chifre” é semelhante demais a 5:6 para ser ignorada.
[35] – O verbo no tempo imperfeito “εἶχεν” (eichen, estava tendo) é dramático, enfatizando a natureza progressiva do surgimento da besta.
[36] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 264.
[37] – Section 3 – Our Doctrinal Standards and General Rules.
[38] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 576.
[39] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 264.
[40] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 553.
[41] – Não no sentido ensinado pelos dispensacionalistas que acreditam em uma tribulação de sete anos que está vinculada ao cumprimento de Daniel 9:24 – 27. Eu acredito que esta seja uma profecia messiânica já cumprida em Cristo. Mas haverá um aumento da tribulação (tanto em intensidade quanto em frequência) antes do tempo do fim? Eu diria que é uma possibilidade real, e a Bíblia nos adverte que podemos ser chamados a sofrer durante um tempo de “Grande Tribulação”, enquanto ao mesmo tempo nos encoraja com a promessa do Deus de graça Todo–suficiente sob as mais difíceis circunstâncias. Como Beale coloca: — “A Grande Tribulação já começou com os sofrimentos e o sangue derramado de Jesus, e todos os que seguem Ele devem igualmente sofrer através dEle”.
[42] – O que é Gematria? Em hebraico, grego e latim as letras do alfabeto também funcionavam como números. As nove primeiras letras correspondiam de um a nove, o nove seguinte significava dez por noventa, e assim por diante. Gematria usava essas equivalências como um jogo de palavras codificadas, em que as palavras e os nomes eram representados pela soma de seus equivalentes numéricos. Um exemplo popular é um granito de Pompéia: — “Eu amo cujo número é 545”. O número 318 para o servo de Abraão (Gênesis 14:14), foi decifrado como Eliezer numa tradição rabínica (Aune, 1998, p. 771), porém, o trabalho de apenas um número total prova ser um enigma com uma gama de possibilidades. Adivinhar pode ser a habilidade mais útil na interpretação de tais números.
[43] – MOODY, p. 50.
[44] – Veja: — 1 – Abernethie, Thomas. “Abjuration of Popery” (Abjuração do Papado). 2 – Beza, Theodore. “The Pope’s Canons” (Os Cânones do Papa). 3 – Mayer, John. “An Antidote Against Popery” (Um Antídoto Contra o Papismo). 4 – Puffendorff, Samuel. “The History of Popedom” (A História do Papado). 5 – Wylie, J. A. “The Papacy is the Antichrist” (O Papado é o Anticristo). 6 – Downame, George. “A Treatise concerning Antichrist” (Um Tratado sobre o Anticristo). 7 – Rutherford, Samuel. “A Survey of the Spiritual Antichrist” (Uma Pesquisa sobre o Anticristo Espiritual). 8 – Whitby, Daniel. “The Fallibility of the Roman Church” (A Falibilidade da Igreja Romana). 9 – Knox, John. “Admonition to Flee Idolatry, Romanism and all False Worship” (Admoestação para fugir da idolatria, do romanismo e de toda a falsa adoração). 10 – Clarkson, David. “Doctrine of Justification is dangerously corrupted in the Roman Church” (A doutrina da justificação está perigosamente corrompida na Igreja Romana). 11 – Stewart, Alexander. “Roman Dogma and Scripture Truth” (O Dogma Romano e a Verdade das Escrituras). 12 – M’donald, John. “Romanism Analyzed in the Light of Scripture, Reason and History” (Romanismo Analisado à Luz das Escrituras, da Razão e da História). 13 – Webster, Daniel. “The Church of Rome at the Bar of History” (A Igreja de Roma na Perspectiva da História). 14 – Whitaker, William. “Disputations on Holy Scripture” (Disputas sobre a Sagrada Escritura). 15 – Plumer, William. “Earnest Hours” (Horas de Trabalho). 16 – Guinness, H. Grattan. “Romanism and the Reformation from the Standpoint of Prophecy” (O Romanismo e a Reforma do Ponto de Vista da Profecia). 17 – Brown, John (of Haddington). “Absurdity and Perfidy of all Authoritative Toleration of Gross Heresy, Blasphemy, Idolatry, Popery in Britain” (Absurdo e Perfídia de toda a Tolerância Autoritária de Heresia Grosseira, Blasfêmia, Idolatria e Papismo na Grã–Bretanha). 18 – Dabney, Robert L. “Attractions of Popery” (“Atrativos do Papismo). 19 – George, R. J. “Badge of Popery” (“Distintivo do Papismo”). 20 – Gavin, Anthony. “History of Popery” (História do Papismo). 21 – Fairbairn, Patrick. “Is Popery the Antichrist?” (O Papado é o Anticristo?). 22 – Wilkinson, Henry. “Pope of Rome is Antichrist” (O Papa de Roma é o Anticristo). 23 – Doolittle, Thomas. “Popery is a Novelty” (O Papado é uma Inovação). 24 – Henry, Matthew. “Popery, A Spiritual Tyran” (O Papado, uma Tirania Espiritual). 25 – Ness, Christopher. “Protestant Antidote against the Poison of Popery” (Antídoto Protestante contra o Veneno do Papado). 26 – Blakeney, R. P. “Protestant Catechism or Popery Refuted” (Catecismo Protestante ou Papado Refutado). 27 – Fleming, Robert. “Rise and Fall of the Papacy” (Ascensão e Queda do Papado). 28 – Calvin, John. “Rise of the Papacy with Proof from Daniel and Paul” (Ascensão do Papado com Provas em Daniel e Paulo).
[45] – Works by Cranmer, Vol. 1, p. 6 – 7.
[46] – Da qual só fez, pelo enfraquecimento pelos mais de dois anos de prisão e para evitar sua execução, o que não adiantou frente a face cruel da Igreja de Roma.
[47] – O Anticristo Jesus o chamou de “o abominável da desolação” (Mateus 24:15). Paulo o chamou de “o homem da iniquidade, o filho da perdição” (2 Tessalonicenses 2:3) e também de “o iníquo” (2 Tessalonicenses 2:8). João o chamou de “o Anticristo” (1 João 2:18) e também “a besta que emerge do mar” (Apocalipse 13:1; 19:20). O Anticristo receberá o poder, o trono e grande autoridade de Satanás (Apocalipse 13:2). Será adorado (Apocalipse 13:4). Parecerá invencível (Apocalipse 13:4). Vai perseguir e matar os santos (Apocalipse 13:7). Será adorado por todos os homens, exceto aqueles cujo nome está no livro da vida (Apocalipse 13:8). O Anticristo, porém, será derrotado fragorosamente por Jesus Cristo em sua Segunda Vinda (2 Tessalonicenses 2:8). Será lançado no Lago de Fogo para sofrer eternamente (Apocalipse 19:20; 20:10). A Igreja de Cristo, porém, desfrutará das venturas eternas nos novos céus e na nova terra (Apocalipse 21:1 – 7).
[48] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 579.
[49] – Krodel 1989: 255; Roloff 1993: 164.
[50] – “Também as atarás por sinal na tua mão, e te serão por frontais entre os teus olhos” (ACF).
[51] – Pequenas bolsas de couro contendo passagens das Escrituras.
[52] – “E disse–lhe o Senhor: — Passa pelo meio da cidade, pelo meio de Jerusalém, e marca com um sinal as testas dos homens que suspiram e que gemem por causa de todas as abominações que se cometem no meio dela” (ACF).
[53] – “[…] porque é o sinal de Deus sobre os justos para salvação. Fome, espada e morte estão longe dos justos; porque eles fugirão dos santos como os perseguidos da guerra. Mas eles perseguirão os pecadores e, e os atacarão; e os que cometem iniquidade não escaparão ao julgamento do Senhor. Como por experientes em guerra serão agarrados, pois a marca da destruição está sobre suas testas”. Os Salmos de Salomão são um grupo de dezoito salmos pseudepígrafos (erroneamente atribuídos a Salomão) e apócrifos do Antigo Testamento (ou seja, rejeitados pelas principais correntes cristãs). Escritos provavelmente em torno de 60 a.C., eram considerados perdidos, até que no século XVII foi encontrada uma cópia em grego, baseada num texto mais antigo em hebraico ou aramaico. Seu conteúdo é messiânico e crítico contra os sacerdotes e homens ricos, especialmente contra aqueles que entregaram o reino de Israel ao domínio do Império Romano.
[54] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 580.
[55] – Caird 1966: 173; Johnson 1981: 532 – 533.
[56] – Corporações de ofício (do latim “corpora” ou “collegia”) também chamadas guildas ou mesteirais, associações de pessoas qualificadas em um ofício (semelhante aos sindicatos) que surgiram a partir do século XII com as transformações no feudalismo na Idade Média (século V – XV) oriundas das antigas Guildas, com objetivos de: — controle econômico dos governantes (teoricamente); regulamentar as profissões e o processo produtivo artesanal nas cidades; defenderem e negociarem de forma mais eficiente, e; evitar a concorrência.
[57] – OSBORNE, Grant R. Apocalipse – Comentário Exegético, tradução de Robinson Malkomes, Tiago Abdalla T. Neto, São Paulo, Edições Vida Nova, 2014, p. 581.
[58] – Rowland 1999:355.
[59] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 569.
[60] – O distintivo genuíno da Igreja de Cristo é ter a palavra de Deus como regra de fé e prática.
[61] – BEALE, G. K. Brado de Vitória, traduzido por Paulo Sérgio Gomes, São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2017, p. 570.
[62] – “Saiba que nos últimos dias haverá tempos muito difíceis. Porque as pessoas só amarão a si mesmas e ao dinheiro. Serão arrogantes e orgulhosas, zombarão de Deus, desobedecerão a seus pais e serão ingratas e profanas. Não terão afeição nem perdoarão; caluniarão outros e não terão autocontrole. Serão cruéis e odiarão o que é bom, trairão os amigos, serão imprudentes e cheias de si e amarão os prazeres em vez de amar a Deus. Serão religiosas apenas na aparência, mas rejeitarão o poder capaz de lhes dar a verdadeira devoção. Fique longe de gente assim!” (NVT).