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Embora com menos frequência do que antes, ainda vejo, ocasionalmente, a palavra “escolástico” sendo usada pejorativamente – em outras palavras, como um termo depreciativo. Quando alguém é rotulado como “escolástico”, há uma presunção de que ele esteja entre os “vilões” da história da Teologia. Isso é semelhante ao uso da palavra “puritano” para algumas pessoas, que a consideram um insulto. Se alguém é chamado de “puritano” ou “puritânico” [rigorista], é visto, no mínimo, com desconfiança. O mesmo ocorre com “escolástico” – uma palavra carregada de conotações negativas que imediatamente lança uma sombra sobre a pessoa assim qualificada.

Em determinado período, essas ideias eram amplamente aceitas. No entanto, nas últimas duas ou três décadas, a forma como o escolasticismo é discutido passou por uma mudança significativa, influenciada especialmente por estudiosos como Richard A. Muller (1948), David Curtis Steinmetz (1936 – 2015) e Willem J. van Asselt (1946 – 2014). Atualmente, reconhece-se amplamente que o escolasticismo era um método de ensino da Teologia – não possuía um conteúdo específico em si. Existiram escolásticos medievais, escolásticos católicos romanos, escolásticos luteranos e escolásticos reformados. Cada grupo utilizou o método escolástico para ensinar a Teologia que consideravam correta.

Minha apreciação por esse método de ensino se aprofundou durante minha pesquisa de doutorado sobre a Confissão Belga. O escolasticismo medieval está presente no pano de fundo da Confissão Belga, especialmente em sua estrutura (veja o capítulo 4 de “For the Cause of the Son of God – Pela Causa do Filho de Deus”). Já o escolasticismo protestante é ainda mais evidente no contexto dos Cânones de Dort. Embora os Cânones em si não sejam escolásticos — e isso tenha sido uma escolha deliberada — eles carregam as marcas de homens que se beneficiaram desse método. Não é de se estranhar. Muitos dos delegados do Sínodo de Dort eram teólogos que utilizavam o método escolástico ou pastores que haviam recebido sólida formação escolástica.

Também obtive benefícios ao estudar este método. Embora considere que a adoção do método escolástico no contexto contemporâneo não seja apropriada, há ainda muito a ser apreendido com ele, especialmente na maneira como foi aplicado pelos teólogos reformados no período pós–Reforma. Permita-me expor dez ensinamentos que extraí da escolástica reformada.

1 – A melhor Teologia começa com uma exegese sólida.

Os escolásticos reformados enfrentam frequentemente o estigma de serem vistos como meros “textualistas”. Embora suas obras teológicas citem amplamente as Escrituras, nem sempre se debruçam profundamente sobre discussões exegéticas nesses textos (existem exceções). Contudo, isso não implica que a exegese estivesse ausente – bem pelo contrário!

Na realidade, muitos teólogos escolásticos, antes de se dedicarem à produção de obras teológicas, elaboraram extensos estudos exegéticos.

Apenas sobre o livro de Romanos, a “Post–Reformation Digital Library” lista 236 títulos. Embora nem todos sejam de autoria reformada, muitos o são. O estudo bíblico profundo constituiu a base para a Teologia reformada ensinada através do método escolástico.

2 – A importância da História.

Vivemos numa era frequentemente indiferente à história. Como método nas mãos dos teólogos reformados, o escolasticismo trabalhava com os pensamentos e conclusões de autores já falecidos há muito tempo. Por exemplo, ao folhear uma página aleatória de um importante texto escolástico frequentemente denominado “The Leiden Synopsis”, encontro Antonius Thysius[2] (1565 – 1640) discutindo o significado de ser criado à imagem de Deus. Ele se refere à visão de Tertuliano e de outros, segundo a qual “o homem inteiro é propagado a partir do homem inteiro”. Mais adiante na mesma página, ele interage com outro Pai da Igreja, Orígenes. O fato de estarem tão profundamente familiarizados com esses Pais da Igreja evidencia que suas discussões se situavam em um nível distinto em relação a muitas das nossas atualmente.

3 – A importância do sistema.

Embora não tenham sido os primeiros a reconhecer isso, os escolásticos reformados sustentavam que a Teologia bíblica é um sistema interconectado. Nesse sistema, todas as partes se relacionam de alguma forma com as demais. Além disso, a maioria desses teólogos compreendia claramente que existe uma “lógica” intrínseca à Teologia cristã. Assim, ao consultar um texto como o “Syntagma Theologiae Christianae” de Amandus Polanus, pode-se esperar que ele inicie com questões preliminares (prolegômenos), avance para a doutrina das Escrituras, depois para a doutrina de Deus, e aborde a criação, o pecado, a redenção e, por fim, a doutrina das últimas coisas. Esse padrão tem sido adotado por muitos teólogos sistemáticos desde então.

4 – A arte de formular boas perguntas.

Para se alcançar respostas precisas e úteis, é imprescindível formular boas perguntas. Os teólogos escolásticos reformados eram notáveis pela sua habilidade em criar questões que direcionavam para respostas esclarecedoras. Esse processo constituía um aspecto requerido do método escolástico de formação. As questões eram elaboradas em forma de tese ou interrogativa. Embora o Catecismo de Heidelberg não seja um documento escolástico, o comentário de Zacharias Ursinus (1534 – 1583) sobre o Catecismo se insere claramente nesse contexto. Ao tratar da Pergunta e Resposta 21 sobre a fé verdadeira, Ursinus delineia seis perguntas–chave que ajudam a esclarecer essa doutrina:

1 – O que é a fé?

2 – Quantos tipos de fé são mencionados nas Escrituras?

3 – Em que a fé se diferencia da esperança?

4 – Quais são as causas eficientes da fé justificadora?

5 – Quais são os efeitos da fé?

6 – A quem é concedida?

Esse método também foi aplicado por François Turrettini (1623 – 1687) em suas “Institutas de Teologia Elêntica”, bem como por muitos outros teólogos.

5 – Uso de definições precisas.

Os teólogos utilizam frequentemente os mesmos termos com significados distintos. Por exemplo, um teólogo católico romano pode empregar o termo “justificação” de uma maneira que difere substancialmente do uso feito por um teólogo reformado. Portanto, é fundamental definir com precisão os termos relevantes. No tocante à justificação, Petrus van Mastricht (1630 – 1706) serve como um exemplo elucidativo. Em sua obra “Theoretico–Practica Theologia” (6.6), ele inicia com uma análise exegética abrangente dos textos pertinentes (ver ponto 1 acima) e, em seguida, procede a uma discussão dogmática fundamentada nessa análise. Dentro desse contexto, ele oferece uma definição precisa de justificação: — com base na justiça de Cristo, Deus absolve os crentes de todos os seus pecados e os declara justos para a vida eterna. Van Mastricht afirma que a justificação inclui a imputação dos nossos pecados a Cristo e da justiça dEle a nós. Ele não assume a definição desse termo–chave, mas a torna compreensível claramente e avança com base nela.

Paz e graça.
Pr. Dr. Plínio Sousa[3].

[1] – Ten Things I Learned from Reformed Scholasticism (1) By Rev. Wes Bredenhof — https://yinkahdinay.wordpress.com/2016/04/19/ten-things-i-learned-from-reformed-scholasticism-1/ — Acessado em 2016.

[2] – Antonius Thysius foi um teólogo reformado holandês, professor na Universidade de Harderwijk e na Universidade de Leiden — nota do revisor.

[3] – Tradutor: — notas e significações.

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